Em fevereiro de 2020, quando o primeiro caso de Covid-19 foi confirmado no Brasil, uma equipe de cientistas se mobilizou para compreender o novo vírus que chegava ao país. À frente desse grupo estava Jaqueline Goes de Jesus, biomédica baiana que coordenou o sequenciamento genético do SARS-CoV-2 em tempo recorde — apenas 48 horas após a confirmação do caso. O feito colocou o Brasil entre as nações pioneiras na vigilância genômica do coronavírus e fez de Jaqueline um dos nomes mais importantes da ciência brasileira contemporânea.
Nascida em Salvador (BA), Jaqueline sempre se destacou pela curiosidade e pela paixão pela ciência. Formou-se em Biomedicina pela Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública e seguiu carreira acadêmica com mestrado em Biotecnologia em Saúde e Medicina Investigativa pelo Instituto Gonçalo Moniz (Fiocruz Bahia). Concluiu o doutorado em Patologia Humana e Experimental pela Universidade Federal da Bahia, com ênfase em virologia e doenças infecciosas. Desde cedo, trabalhou com vírus como dengue, zika e chikungunya, experiência que seria decisiva no enfrentamento da pandemia.
Durante a crise sanitária, o trabalho de Jaqueline e sua equipe no Instituto de Medicina Tropical da Universidade de São Paulo (USP) foi determinante para entender como o vírus se espalhava pelo país e quais mutações apresentava. O sequenciamento rápido permitiu rastrear as origens das primeiras infecções e antecipar medidas de controle. O resultado foi amplamente reconhecido por pesquisadores do mundo todo, que destacaram a agilidade e a precisão do grupo brasileiro.
Antes mesmo da pandemia, Jaqueline já havia contribuído para o sequenciamento do vírus da zika, durante a epidemia de 2015, um projeto que a colocou em contato com instituições internacionais de ponta, como a Universidade de Oxford. Essa experiência consolidou sua trajetória na área de vigilância genômica, campo essencial para a prevenção e o controle de surtos virais.
Mas o legado de Jaqueline vai além dos laboratórios. Como mulher negra, nordestina e cientista, ela se tornou um símbolo de representatividade e resistência em um meio ainda marcado pela desigualdade de gênero e raça. Sua imagem ultrapassou fronteiras quando foi homenageada pela fabricante de brinquedos Mattel, que lançou uma boneca Barbie inspirada em sua figura — uma forma de reconhecer o papel das mulheres na ciência e de inspirar meninas ao redor do mundo.
Em 2021, recebeu a Comenda Zilda Arns, concedida pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS), em reconhecimento à sua contribuição para a saúde pública e à defesa do direito à ciência. Nos anos seguintes, continuou a se dedicar à pesquisa e à divulgação científica, enfatizando a importância de comunicar o conhecimento de forma acessível. “A ciência precisa chegar às pessoas, não apenas aos pares acadêmicos”, afirmou em uma de suas entrevistas.
Apesar das dificuldades enfrentadas pelos cientistas no Brasil — falta de recursos, cortes em bolsas e pouca visibilidade —, Jaqueline tornou-se exemplo de como o talento e a determinação podem romper barreiras estruturais. Sua trajetória inspira uma nova geração de pesquisadores e reafirma o papel central da ciência nacional em desafios globais.
Hoje, Jaqueline Goes de Jesus é reconhecida não apenas como uma cientista brilhante, mas como um símbolo de inclusão, coragem e inovação. De Salvador aos laboratórios de ponta da USP, sua história mostra que a excelência científica também nasce da diversidade — e que o futuro da ciência brasileira tem o rosto e a voz de uma mulher negra que desafiou limites para transformar o mundo com conhecimento.





