A morte nunca pede licença. Chega como o vento, muda tudo de lugar e nos deixa diante do irreversível. Em 2008, Fredi Jon sentiu seu peso três vezes. Em maio, perdeu Antônio Carvalho, o amigo radialista cuja voz ressoava entre reflexões e conversas sobre o mundo. Em agosto, o golpe foi mais profundo—seu pai, Jorge, partiu, deixando para trás um silêncio tão grande que parecia preencher cada canto. Mas a morte ainda não havia terminado. Em 2 de novembro, levou sua mãe. Como se seguisse uma lógica cruel, esperou o Dia de Finados para encerrar um ciclo que Fredi jamais quisera ver completo.
E então veio a pergunta inevitável: o que sobra quando nos tiram aqueles que nos deram tudo?
O violão parecia pesar mais em suas mãos. A música, que tantas vezes foi um portal para a felicidade, agora era um espelho de sua dor. Ele poderia ter se calado. Poderia ter desaparecido entre as sombras do luto. Mas não. Porque mesmo dilacerado, algo dentro dele se recusava a ceder.
Ele seguiu tocando. Noites vieram e passaram, e a cada serenata, uma nova batalha. O que antes era um dom agora parecia um desafio. Como cantar o amor quando tudo que restava era ausência? Como falar de vida quando a morte o abraça e também o mata por dentro?
Mas então, algo começou a emergir da dor. A serenata, aquela mesma que tantas vezes levou emoção aos outros, agora falava com ele. O que amamos permanece naquilo que fazemos. O que perdemos se mantém vivo naquilo que escolhemos continuar.
Foi assim que percebeu: a morte não cala a música. Pelo contrário, ela a torna ainda mais necessária.
Cada canção que tocava carregava dentro dela os ecos do que um dia foi. Seu pai e sua mãe estavam ali, no som que vibrava de sua craviola. Antônio Carvalho sorria em silêncio, em algum lugar. Nenhuma melodia os traria de volta, mas enquanto houvesse música, eles nunca estariam completamente ausentes.
Naquela noite quente de dezembro, enquanto tocava para um casal que celebrava sessenta anos juntos, algo mudou. Quando terminou a última nota, não houve apenas aplausos. Houve silêncio. Um silêncio que não era vazio, mas cheio. Cheio de tudo o que ele havia perdido, e de tudo que, de alguma forma, ainda permanecia.
E então Fredi entendeu: ele não tocava apesar do luto. Tocava porque a música era a única coisa que a morte não podia levar.



