A imagem de um luthier é sempre focada sobre aquela do Geppeto: um pequeno atelier isolado, um artesão que trabalha sobre o olhar atento de seu gato e de seu peixe vermelho, ocupado em dar vida a qualquer pedaço de madeira.
O luthier é um fabricante, reparador ou conservador de instrumentos de cordas e caixas de ressonância, segundo técnicas tradicionais. Uma profissão bem complexa, que exige várias aptidões necessárias que, reunidas, permitirão um luthier experimentado exercer sua arte, transformando qualquer quilo de madeira ou alguns objetos, que poderiam ser esquecidos em estantes empoeiradas ou até mesmo em lixeiras, em instrumentos de sonoridade.
O Diário do Rio foi recebido no atelier D’Ávila Custon Guitar, do jovem luthier Daniel D’Ávila, em Miguel Pereira, para conhecer um pouco mais de antiga profissão, que antes era passada de pai para filhos e hoje tem atraído e despertado a curiosidade de alguns jovens.
Como foi o processo de aprendizado até a sua formação?
Além do conhecimento de marcenaria adquirido através do meu pai, aos 19 anos descobri o curso de Lutheria como projeto de extensão da UFSJ [Universidade Federal de São João del-Rei, em Minas Gerais] e, a partir de lá, só confirmo, a cada dia em que estou no meu atelier que fiz a melhor escolha.
Quais as qualidades necessárias para ser e exercer a profissão?
Ele deve ser músico, ter um bom ouvido, possuir uma certa habilidade para criação e montagem de seus instrumentos, conhecimento de diferentes materiais, como madeira, feltro, couro e metal, ter curiosidade, criatividade e paixão pela profissão.
Sua posição diante da modernidade…
A modernidade trouxe novas ferramentas, novos acessórios, conexões, um conhecimento e uma interação maior entre os profissionais da área. Mas as técnicas são heranças que muito pouco, ou quase nada, se modificaram na atualidade.
Como surgiu a ideia de transformar, por exemplo, caixas antigas de charutos e de biscoitos em instrumentos musicais?
Em minha opinião, todo e qualquer instrumento musical é uma expressão da arte e um objeto de fazer arte. Como um apaixonado pelo blues e de suas referências, me vi diante do mundo das ‘cigar box’, uma herança do período da grande crise norte-americana, onde o acesso a instrumentos musicais era restrito aos mais afortunados, mas a música, o blues e a vida não podiam parar. Baseado nesta ideia, deixei que a imaginação, a curiosidade e minha criatividade se expressassem a partir dos instrumentos.
Algum projeto profissional e de vida?
Gostaria de expandir as possibilidades da Lutheria como ferramenta educacional, a fim de mostrar que o conhecimento e as habilidades individuais, tanto na concepção dos instrumentos, quanto na execução musical, são ferramentas muito mais valiosas do que o instrumento em si. Mais uma vez, indo buscar no passado para modificar o futuro, resgatando o valor do exercício na prática. Do faça você mesmo, trazendo as possibilidades do virtual para o mundo real.
Daniel diria o que da Lutheria e de ser Luthier?
Daniel – Eu diria que a Lutheria é um metier de contato que requer atenção ao executar sua obra, ter curiosidade, criatividade e saber seguir as evoluções das técnicas atuais, respeitando, sempre, as tradicionais. Nossa profissão é muito antiga, mas se tivermos uma boa dose de abertura, amor pelo que fazemos e um bom espírito, ela é vencida de maneira bem moderna.
Fica nosso agradecimento ao profissional Luthier Daniel D’Ávila por ter nos recebido, em seu atelier, e disponibilizado de seu tempo e de sua atenção para com o jornal.
Vitor Chimento, biólogo e jornalista
MTb 38582RJ