Por Sandro Barros
O Ministério da Educação (MEC), sob pressão de especialistas em educação, parlamentares e estudantes, anunciou o adiamento do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). A decisão foi divulgada no dia 20 de maio.
“Atendendo às demandas da sociedade e às manifestações do Poder Legislativo em função do impacto da pandemia do coronavírus no Enem 2020, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep, responsável pelo exame) e o Ministério da Educação (MEC) decidiram pelo adiamento da aplicação dos exames nas versões impressa e digital. As datas serão adiadas de 30 a 60 dias em relação ao que foi previsto nos editais”, diz comunicado da pasta.
Até então, o Enem estava previsto para ser realizado em 1º e 8 de novembro, na versão impressa, e 22 e 29 de novembro, na versão digital. Agora, a nova data será decidida após uma enquete entre os inscritos, prevista para junho. Mesmo assim, as inscrições para o exame continuaram abertas até as 23h59 de 22 de maio, conforme informou o Inep.
O adiamento ocorreu um dia depois que Senado aprovou um Projeto de Lei prorrogando processos seletivos pré-universitários, incluindo vestibulares e o Enem. O projeto, que agora passa a tramitar na Câmara dos Deputados, foi aprovado por 75 votos a um ─ o único voto contra foi o do senador Flávio Bolsonaro.
Pressão e recuo
Dias antes o MEC anunciar o adiamento, o ministro da Educação, Abraham Weintraub ─ inicialmente um forte defensor da manutenção da data do Enem ─ havia dado sinais de que aceitaria a mudança de calendário.
“Diante dos recentes acontecimentos no Congresso e conversando com líderes do centro, sugiro que o Enem seja adiado de 30 a 60 dias. Peço que escutem os mais de quatro milhões de estudantes já inscritos para a escolha da nova data de aplicação do exame”, disse Weintraub pelo Twitter na manhã do dia 20 de maio.
Para diversos especialistas em educação, no atual cenário da pandemia do novo coronavírus, em que jovens estão cursando o ensino médio em condições particularmente desiguais, havia o risco de que a manutenção da data do Enem elevasse as desigualdades de acesso ao ensino superior no Brasil.
“As condições de estudos dos alunos estão muito diferentes”, argumentou Lucas Fernandes, gerente de estratégias políticas da organização Todos Pela Educação, em entrevista à BBC News Brasil em 11 de maio, data em que foram abertas as inscrições do Enem.
“Temos redes [estaduais e municipais] que conseguem oferecer ensino remoto e até oferecer pacotes de dados de internet para os alunos. E temos redes que ainda estão planejando o que fazer. Do ponto de vista dos alunos, as diferenças no acesso a computadores e a internet são as mais evidentes. Mas há também diferenças em literacia digital: pessoas mais vulneráveis podem ter acesso a celulares, mas não fazem uso frequente, para estudar, no dia a dia. As evidências mostram que, na hora das avaliações, esses estudantes menos letrados têm performance pior.”
Adiamentos ao redor do mundo
Embora o Brasil não estivesse sozinho na manutenção de seus exames nacionais estudantis, o país era parte de um grupo minoritário. Um levantamento da Unesco (agência da ONU para a educação) de 11 de abril ─ e, portanto, sujeito a atualizações, uma vez que os cenários nacionais estão mudando constantemente ─ apontava que cerca de 20 países decidiram manter todos ou parte de seus exames. Além de Brasil, estavam no grupo Alemanha, Finlândia, Nova Zelândia, Colômbia e Costa Rica, entre outros.
Entretanto, cerca de 80 países cancelaram, adiaram ou remarcaram suas avaliações estudantis, entre eles EUA, Reino Unido, China, Irlanda, Espanha, Coreia, França e Noruega. E alguns outros, como Alemanha, Finlândia e Colômbia, aparecem mais de uma vez na listagem, por terem mais de um exame sendo levado em consideração pela Unesco ou por adotarem múltiplas estratégias simultaneamente nos âmbitos regionais.
O que é o Enem?
O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) foi criado em 1998, com o objetivo de avaliar o desempenho dos estudantes concluintes do ensino médio. A partir de 2004, a prova passou a ser utilizada como ferramenta para ingresso em instituições do ensino superior e, em 2010, com sua inclusão no Sistema de Seleção Unificada (Sisu), foi reconhecido como o maior e mais completo exame educacional do Brasil.
Ao longo de sua criação, o Enem acabou substituindo o tradicional vestibular realizado por faculdades e universidades nacionais, tornando-se hoje ferramenta para concessão de bolsas de estudo parciais e integrais em faculdades particulares, através do Programa Universidade Para Todos (Prouni).
O Enem é também o método utilizado para que estudantes obtenham os financiamentos disponibilizados pelo governo federal: Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e Programa de Financiamento Estudantil (P-Fies). O exame contempla ainda estudantes de cursos técnicos por meio do Sistema de Seleção Unificada da Educação Profissional e Tecnológica (Sisutec). Todos os anos milhares de estudantes realizam a avaliação.