Por Claudia Mastrange
Com a ocupação dos leitos de UTT ultrapassando a marca os 90% no sistema público de saúde do Rio, que já beira o colapso há anos, a prefeitura anunciou reforço nas medidas restritivas, que valem até 22 de março. O objetivo é tentar conter o avanço do contágio por covid-19 e a superlotação das unidades de saúde, o que pode impulsionar ainda mais a triste estatística de mais de 34 mil mortes no estado.
O Decreto nº 48.604, publicado no Diário Oficial na quinta-feira (11/3) estabeleceu algumas modificações em relação ao documento anterior, como os horários escalonados de funcionamento de comércio, serviços e administração pública, para melhor distribuir o fluxo diário de passageiros nos transportes públicos e, assim, evitar as aglomerações. Além disso, quiosques e ambulantes poderão voltar a atuar nas praias com horários específicos.
“A gente tem uma ampliação de números de casos de pessoas que procuram a rede pública com sintomas da Covid-19. É esse número que nos faz tomar medidas preventivas. O que estamos tentando fazer neste momento é evitar que a curva de mortes cresça. Como faz isso? Com tratamento adequado, porque, na hora que tiver superlotação não vai conseguir dar tratamento clinico nenhum”, afirmou o prefeito Eduardo Paes, ao comentar sobre as novas medidas.
Ressaltando que as medidas foram discutidas com as entidades empresariais, Paes avisou que quem não respeitar as determinações poderá ser multado e estabelecimentos poderão ser fechados. “Respeitem as regras! Esses horários não são facultativos, são compulsórios. Identificamos que os principais vetores de contaminação (do vírus) são o transporte público, estabelecimentos de bares e restaurantes, e eventos. Se não respeitar, nós vamos agir com muito rigor e podemos fechar por 15 dias ou até definitivamente”, explicou o prefeito.
Entre as sanções para quem descumprir as medidas, está uma multa gravíssima, cujo valor varia de R$ 14.060,74 a R$ 56.242,92. Prevista no Código Sanitário em vigor, ela será aplicada em casos reincidentes.
O secretário de Saúde Daniel Soranz reforçou: “A tolerância vai ser zero. Não vai ser tolerado nenhum tipo de aglomeração. Se descumprir, se aglomerar, o bar será fechado por 15 dias. Está todo mundo mais do que avisado, a gente já comunicou diversas vezes, principalmente à associação de bares e restaurantes”, alertou.
O prefeito voltou a fazer um apelo à população para que respeite as novas medidas, além das regras sanitárias já amplamente divulgadas. “ É importante que se entenda isso. Se as pessoas não usarem máscara, não mantiverem o mínimo de distanciamento social, se não usarem álcool em gel vão transmitir a doença, vão adoecer e vão colaborar para a superlotação dos hospitais. Essa pandemia é a coisa mais anticarioca que existe, somos uma cidade que gosta de abraçar e aglomerar, mas nesse momento específico isso não é adequado. Por isso a restrição. Evitar agora para não ter que ficar chorando a morte de ninguém depois – disse o prefeito, durante a divulgação da 10ª edição do Boletim Epidemiológico da Covid-19, nesta quinta-feira, no Centro de Operações Rio (COR), na Cidade Nova.
Hospitais de campanha: desmonte antes da segunda onda
Uma das primeiras medidas da nova gestão municipal, em janeiro, foi acelerar o desmonte do hospital de campanha do Riocentro, último a cidade ainda de pé no inicio do ano, depois que o instalado no Maracanã teve encerradas as suas atividades em outubro de 2020.
Segundo informações da SMS, no início do ano, especialistas em saúde são contrários ao atendimento de alta complexidade em hospitais temporários e há leitos na cidade inativos por falta de pessoal. Haveriam 2.200 leitos desativados por falta de profissionais em unidades já existentes das redes municipal e federal. SMS informou que iria investir em leitos nos hospitais de referência, o que também significaria redução de custos.
“A estimativa é que sejam economizados R$ 250 mil por dia com a abertura dos mesmos leitos no Hospital Municipal Ronaldo Gazolla. A diária no Hospital de Campanha do Riocentro custa em torno de R$ 12.500, bem acima da média até mesmo de hospitais particulares”, ressaltou nota da secretaria de Saúde.
Os Hospitais de Campanha do Riocentro e o do Maracanã foram abertos em maio de 2020, com o crescimento acelerado de casos da covid-19. A previsão era que fossem abertos sete hospitais, mas, mesmo os dois únicos inaugurados pela prefeitura escancararam ainda mais o sistema de corrupção que autoridades publicas mobilizaram para faturar em cima de uma tragédia de saúde publica.
O hospital de Campanha o Maracanã foi alvo de diversas denúncias. Funcionários relataram falta de pagamento e de equipamentos . A unidade era uma das geridas pela OS Iabas, afastada da administração dessas unidades em junho de 2020 pelo governo estadual. Suspeitas sobre irregularidades em contratos firmados com o Iabas foram citadas na denúncia que embasou o pedido de impeachment contra o governador afastado, Wilson Witzel.
No inicio o ano, com a delação premiada do secretário de Saúde Edmar Santos, descobriu-se que equipamentos superfaturados, incluindo respiradores obsoletos. macas que quebravam com o peso do paciente, máscaras de papel e outros absurdos. Tudo ocupava um galpão em São Gonçalo, cujo aluguel custava aos cofres públicos a bagatela de R$1 milhão por mês.
Em suma, os desmandos administrativos e a corrupção endêmica que assolam o Rio tornam ainda mais caótica a situação a Saúde pública na cidade. E desvia os olhares do parecer técnico daquilo que realmente importa. Se os hospitais de campanha foram fechados, é preciso estruturar e equipar as unidades em nível municipal, estadual e federal, para assistir a população. Reativar leitos, contratar equipes de saúde, buscar soluções. É claro que a população precisa fazer sua parte, com as medidas protetivas e evitando aglomerações. Mas ao gestor publico cabe botar ordem na casa e não fugir às suas responsabilidades.
Foto: Marcello Casal/ ABr