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MPF vê governo do RJ sem preparo diante da violência sexual em prisões

Da Agência Brasil

O Ministério Público Federal (MPF) e outras dez instituições emitiram uma nota técnica que aponta o despreparo do governo do Rio de Janeiro para lidar com casos de violência sexual contra mulheres e meninas nos presídios e nas unidades socioeducativas voltada para menores de 18 anos de idade. De acordo com o documento, a Secretaria do Estado de Administração Penitenciária (Seap) e o Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase) estão agindo de modo inadequado.

Entre as entidades signatárias estão as Defensorias Públicas da União e do Estado do Rio de Janeiro, a Ordem dos Advogados do Brasil e organizações sociais.

O documento recomenda a implantação de medidas que previnam essas ocorrências, e elenca cuidados a serem prestados às vítimas. A Seap e o Degase, segundo o MPF, não estariam adotando procedimentos necessários como o acionamento de delegacias especializadas e de instituições do sistema de justiça em casos de violência sexual, bem como o encaminhamento das vítimas para a rede de saúde para que tenham acesso à profilaxia para DST/HIV, a métodos contraceptivos de emergência e a atendimento psicossocial.

A nota técnica é publicada cerca de um mês após uma jovem de 18 anos de idade, presa por posse de maconha, ter sido estuprada por um agente de segurança enquanto aguardava a audiência de custódia na Cadeia Pública José Frederico Marques, em Benfica, na zona norte da capital fluminense.

O Centro de Socioeducação Professor Antônio Carlos Gomes da Costa, na zona norte da capital fluminense, é um dos locais com ocorrências recentes. O Mecanismo para Prevenção e Combate à Tortura, órgão vinculado à Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), que também assina a nota técnica, inspecionou o local em junho deste ano e relatou uma endemia de assédio às adolescentes.

Para as instituições, as ocorrências violam a Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes da Organização das Nações Unidas (CAT), tratado internacional do qual o Brasil é signatário. A nota técnica cita a jurisprudência da Corte Interamericana dos Direitos Humanos, que condenou o Brasil em 2017 em caso que tratava de estupro realizado por agentes de estado. O crime foi considerado tortura.

“A inadequação das estruturas do sistema prisional e socioeducativo não apenas facilitaram tais ocorrências, como levam a um cenário tendente a sua repetição”, diz a nota técnica. O documento aponta ainda que a violência sexual contra pessoas privadas de liberdade atingem principalmente os grupos alvo de discriminação em razão da raça, cor e gênero, e impactam desproporcionalmente mulheres e meninas, em especial aquelas em situação de extrema vulnerabilidade.

“Isto faz com que o Estado, quando se trata de instituições totais como presídios e unidades socioeducativas, tenha o dever majorado de cuidado, mormente no que concerne ao direito a vida e a integridade pessoal sendo especial a garantia desses direitos”, acrescenta o documento.

Em nota, a Seap informou que está tomando uma série de medidas para evitar novos casos de violência sexual contra as mulheres no sistema prisional fluminense. Um grupo de trabalho foi instituído em setembro para discutir procedimentos de ingresso nos presídios e unidades socioeducativas. Uma reestruturação da Ouvidoria também tem como objetivo facilitar o recebimento de denúncias e sugestões. “Cabe reforçar que o secretário Fernando Veloso determinou que a Corregedoria apure com o máximo rigor que a lei permitir todos os casos de denúncia de violência contra as mulheres (internas e servidoras) no sistema prisional”, acrescenta a nota.

O Degase, que é vinculado à Secretaria de Estado de Educação (Seeduc), também foi procurado mas não deu retorno.

Vulnerabilidade

Segundo o MPF, em muitas unidades do Rio de Janeiro a carência de itens básicos, até mesmo de higiene, é considerado um fator que contribui para que as jovens privadas de liberdade se tornem vítimas desses crimes. Há relatos de agentes oferecendo lanches, cigarros e celular para contato com familiares em troca de relações sexuais.

Preocupam o MPF e as demais entidades a presença massiva de agentes de segurança do gênero masculino atuando nas unidades em contato com as adolescentes. A nota técnica defende a derrubada do veto ao Projeto de Lei 2131/2016, que prevê que a vigilância e a custódia das adolescentes seja exercida exclusivamente por agentes do gênero feminino. Aprovado pela Alerj em julho, o projeto foi vetado pelo governador Cláudio Castro.

As instituições também apontam a prática da “revista vexatória” como violência e assédio sexual. “Em 2015, duas leis fundamentais foram aprovadas no Rio de Janeiro para impedir sua prática contra familiares quando da visita ao Degase e à Seap. Mesmo com esta proibição, ainda existem relatos sobre a manutenção de sua ocorrência de forma pontual em algumas unidades de ambos os sistemas”, registra a nota técnica.

Em 2019, outro relatório do Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate a Tortura registrou que situações degradantes na Penitenciária Talavera Bruce, no Complexo de Gericinó, na zona oeste do Rio de Janeiro. Segundo o documento, as presas eram submetidas de modo coletivo a procedimentos de revista íntima que causavam profunda sensação de humilhação e violência.

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