O que fazer com a alegria?
O que fazer com a tristeza?
O que fazer com a esperança e os desatinos?
E os sonhos?
E o amanhã errático?
O que fazer com a morte, sempre à espreita?
O que fazer com o desejo, nu e inconsolável?
O que fazer com a estranheza dos dias?
O que fazer com as distâncias que nos separam a todos?
O que fazer com o homem incompreendido e arruinado?
O que fazer com as circunstâncias e as pompas sociais?
O que fazer com o sofrimento?
E a filosofia?
O que fazer com os devaneios impublicáveis?
O que fazer com a descoberta das flores na casa dos pais mortos?
O que fazer com a memória? Melhor seria arrancá-la do peito!
O que fazer com o encantamento inaugural dos olhos?
O que fazer com a política nos telejornais?
O que fazer com as coisas singelas e aconchegantes?
E o dinheiro rareando?
O que fazer com o descontentamento e a bílis vinda do fígado?
O que fazer com a fragilidade essencial dos seres?
E a discordância entre povos e credos?
O que fazer com as delícias temporais?
E o perfume amadeirado nos pulsos da mulher amada?
O que fazer com a solidez dos muros inalcançáveis?
O que fazer com a nostalgia dos segredos ruminados ao vento?
E o improvável esquecimento de tudo?
O que fazer com o vazio brandindo no peito?
E a imprudência sem sentido do mal-entendido?
O que fazer com as juras de amor?
O que fazer com o que nasce e aflora gratuitamente?
O que fazer com a indiferença das almas solitárias?
O que fazer com a pretensão dos irônicos?
E a ilusão da serenidade?
O que fazer com o luto permanente pelos ausentes?
O que fazer com a saudade de ti, vozinha?
O que fazer com a luz no ventre das mulheres grávidas?
E a alegria do mundo na face do recém-nascido desvelada?