“Com a criação de mais um encargo, o consumidor ser onerado pelo aumento no preço da prestação do serviço”, diz especialista
Aparentemente, antecipando-se a possibilidade do Supremo Tribunal Federal (STF) julgar, em regime de Repercussão Geral, que não existe vínculo de emprego entre motorista e a plataforma de aplicativo Uber, o governo encaminhou Projeto de Lei Complementar (PLC) que regulamenta o trabalho de motorista de transporte por aplicativo.
Sobre o possível conflito entre o projeto do governo e o julgamento no STF, o advogado Carlos Eduardo Ambiel, sócio do Ambiel Advogados, mestre e doutor em Direito pela USP/SP, professor de Direito e Processo do Trabalho na FAAP/SP, explica que eles seguem em paralelo.
“O que se julga no STF, é o que tem acontecido até agora e, pelo que os ministros já julgaram, há uma tendência do não reconhecimento de vínculo, mas isso vale apenas para os casos já em tramitação na justiça”, diz Ambiel.
Para o advogado, presumindo essa possibilidade, “o governo se antecipa e leva ao Congresso projeto de lei específico para os aplicativos de transporte de carros”, o que para Ambiel, “seria uma solução de enquadramento legal, de proteção previdenciária, e garantia de remuneração mínima”.
Mas, caso o STF entenda que há vínculo, “isso vai valer para tudo o que aconteceu até agora”, diz o advogado, lembrando que se a lei for aprovada, “ela passa a regular as relações dali em diante, o que aconteceu para trás dependerá do entendimento da STF”.
Para o professor de Direito e Processo do Trabalho, ao criar uma contribuição aos empregadores, ou seja, mais um encargo, “corre-se risco de o consumidor ser onerado pelo aumento no preço da prestação do serviço ou o encerramento de atividades de empresas no Brasil”, conclui Ambiel.
Para Washington Barbosa, especialista em Direito Previdenciário, mestre em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas e CEO da WB Cursos, a legislação trabalhista tem que se atualizar. “Criada na década de 40 e mesmo com algumas alterações, a CLT não contempla as novas relações de trabalho, como essa, dos trabalhadores autônomos em plataformas digitais”.
Barbosa entende que segurança previdenciária é fundamental, “mas preferia que não houvesse nenhuma regulamentação”, diz o especialista em Direito Previdenciário.
“Do ponto de vista da segurança previdenciária a proposta é razoável”, diz Barbosa, mas questiona outros aspectos da regulação. “Salário mínimo/hora e jornada de trabalho, por exemplo, um empresário como profissional autônomo não tem esses aspectos”.
Ainda sobre a contribuição previdenciária, Barbosa chama a atenção para a alíquota de 7,5%, que será aplicada sobre 25% do faturamento. “Nós sabemos que o trabalhador autônomo, o contribuinte individual, paga 20% do seu faturamento e isso deverá ser um ponto de atenção nas discussões do Congresso”.
Outra questão levantada, são os direitos previdenciários que os motoristas terão caso o projeto seja aprovado como está. “Enquanto o autônomo tem direito apenas a aposentadoria por tempo de serviço”, diz Barbosa destacando que “os motoristas de aplicativos autônomos terão todos os benefícios previdenciários como, aposentadoria, pensão por morte, auxílio incapacidade temporária e permanente, a antiga aposentadoria por invalidez.”
Barbosa vê como positivo no PLC utilização de arbitragem, no caso de negociação coletiva frustrada, a não exigência de exclusividade e a não limitação da jornada de trabalho. Porém, a multa por descumprimento da lei, de até 100 salários mínimos, estabelecimento de piso salarial e previsão de reajuste anual de, no mínimo, a variação do salário mínimo, são os pontos negativos.
Na opinião dos especialistas, o texto, que foi enviado com urgência constitucional, o que dá 45 dias para a Câmara e 45 dias para o Senado analisarem, deverá provocar muitos debates entre parlamentares.