A doente na cama.
Ajudo a levantá-la, a ir claudicante ao banheiro.
Preparo os remédios, fico atento aos horários.
Trago refeição, água e guardanapos.
Insisto: mais uma colherada, duas, você precisa comer!
Meço a temperatura, o nível de oxigenação, os batimentos cardíacos. Normais, graças a Deus!
Fico ali imóvel, disponível.
Puxo conversa sobre parentes, política, os últimos acontecimentos. Ela reage, fala, sorri eventualmente.
Tem sido assim desde janeiro, há mais de um ano.
Desmarquei compromissos.
Não viajei, praticamente não saí de casa.
Raramente procurei os amigos ou familiares.
Deixei de me preocupar comigo mesmo.
As compras, a cátedra na universidade, a ansiedade diante do futuro, a melancolia do passado, pouco importam agora.
Despojei-me das vaidades, do estrito zelo e gozo egoicos.
Fiquei solitário, como a voz de João Batista clamando no deserto.
Sou um homem oco, sem subjetividade, socialmente delirante.
Tudo se faz límpido e racional repentinamente, não preciso de ansiolíticos.
Dou o melhor de mim, enxugo o suor frio na testa enrugada, seguro as mãos inseguras, sacio fomes, percorro insones madrugadas e corro aos seus primeiros pedidos de socorro.
Somente agora, maduro e árido, aprendo o essencial do amor.
Obrigado, minha mãe!