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Ars Gratia Artis: Papai Noel, Sereia e Peter Pan… existem?

Os pais e adultos em geral costumam se espantar quando descobrem que as crianças fazem associações maravilhosas entre as coisas.  Poéticas, inusitadas, insanas, engraçadas.  Estes são sinais do desenvolvimento de suas singularidades.

Eis que surgiu uma daquelas perguntas aparentemente sem nada em volta.  De repente, não mais que de repente. Ele se virou para mim e lançou : “Papai…Papai Noel, Sereia e Peter Pan…existem”?

Demorei um pouco a responder.  Porque a simplicidade desta pergunta é apenas aparente.   

O personagem Papai Noel,   inspirado em São Nicolau Taumaturgo, arcebispo de Mira, no século IV,  é uma lenda infantil e religiosa.  Alguns pais preferem que as crianças acreditem até certa idade.  Dizem que é uma ilusão saudável e tal.  Que o possível ‘trauma’ da descoberta de sua ‘inexistência’ seria compensado por alguns anos de doce fantasia.

As Sereias, do grego Σειρῆναςfilhas do rio Achelous e da musa Terpsícore, embora oriundas da mitologia,  costumam estar presentes em muitos desenhos animados : forma com as crianças costumam conhecê-las.  

E Peter Pan, o menino mágico que se recusa a crescer, personagem criado inicialmente para o teatro por J.M Barrie,  é figura fácil em desenhos,  filmes, músicas infantis,  por motivos óbvios.

Toda essa informação,  enquanto pensava na resposta – temendo que as sirenas me influenciassem com algo ainda mais terrível do que seu canto,  seu silêncio –  remeteu-me,  por instantes, ao significado de “existir”.  Porque tudo existe,  de alguma forma.  Porque dizer que algo não existe,  em absoluto,  é o mesmo que dizer que nada se pode saber acerca dele,  que é inapreensível,  que é inconcebível,  que é inexistente.

Disse a ele,  então,  que o Papai Noel, as Sereias e o Peter Pan existem,  tomado por tanta riqueza de significados.  Mas diferentemente de nós – enquanto falava,  apalpei o braço dele e suas bochechas – a gente não pode pegar neles nem vê-los,  a não ser na televisão,  nos nossos pensamentos ou em nossa imaginação.  

Isto foi há dois anos.  Hoje em dia,  quando ele me pergunta, por exemplo,  se aquele monstro que ele viu no desenho animado existe,  digo categoricamente que não.  E sobre todas as outras coisas,  quando o interesse de conhecimento dele na existência é bem outro do que o utilitarista,  conversamos sobre tudo.  Porque tudo existe mesmo.

Texto da coletânea ‘Aventuras Uranianas’

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