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Associação Livre: Ano Novo, tudo novo?

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Começo de ano é sempre igual: metas de um lado, promessas de outro. Por mais que saibamos que o tempo segue, inexorável, sua linearidade, cedemos ao simbolismo da renovação e nos apegamos às esperanças que nos reserva um novo ciclo. Mal nenhum haveria nisso se, no entanto, estivéssemos advertidos de que, independentemente de um marco temporal, toda mudança que almejamos em nossas vidas implica em algumas (às vezes muitas) perdas.

Regidos por um sistema que nos acostumou ao acúmulo e a substituição, desaprendemos a perder. Quando, porventura, deixamos algo se perder, invadidos por uma angústia inominável, logo damos um jeito de tamponar a falta. Na maioria das vezes, é pela via da substituição que damos conta do vazio deixado pelo que se perdeu. 

A título de exemplo, em tempos de relacionamentos frívolos, é notável como admitimos as perdas buscando novos contatos, sobretudo em aplicativos de relacionamentos, sem sequer vivenciarmos o luto da relação perdida. E, assim, comumente entramos em relacionamentos “novos” sem que o antigo de fato tenha acabado. Carregamos restos do “mal-acabado”, mal vivendo o novo ao qual buscamos.

Obviamente, há muito do que vivemos no passado nas nossas vivências presentes. Mas, quando nos propomos a mudar de direção, virar páginas, deixar para trás velhos hábitos, devemos fazer as pazes com as perdas. E isso implica suportar angústias, viver os lutos, aceitar as faltas.

Não se faz as pazes com as perdas atropelando-as com uma profusão de experiências, tamponando-as com os produtos da moda, relações fast-food e três horas diárias na academia. Para chegar ao novo, há de se suportar a angústia da travessia. Afinal, ninguém abandona velhos hábitos “da água para o vinho”, como num passe de mágica. Ninguém esquece um amor da noite para o dia, tomando uma pílula. A vida de ninguém muda do dia 31 de dezembro para o dia 01 de janeiro, como se houvesse um portal da nova era a se abrir à meia-noite. Vamos caminhando e deixando, a cada passo, o que não serve mais se perder de nós. Mudanças não são acontecimentos, são processos.

E é assim que os anos se renovam: não no final de um ciclo, mas a cada perda das horas e dias na ampulheta da vida.

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