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César Boaes e sua paixão pela arte

Por Alessandro Monteiro

Luis César Boaes Melo, consagrado artista, produtor, diretor e comediante maranhense, nascido em São Luís. É o mais novo de três irmãos, e viveu uma infância tranquila na cidade de Pedreiras, onde cresceu acostumado a ver o pai ler, escrever e apresentar a eles a poesia e a música.

No currículo, são mais de 30 anos de carreira e sucesso absoluto do espetáculo “Pão com Ovo”, espetáculo recorde de público, visto por mais de 1 milhão de pessoas.

 

Qual o segredo desse grandioso sucesso da comédia “Pão com Ovo”?

Muito trabalho, acordamos e vamos dormir pensando e trabalhando. Temos um bom network e muita preocupação com o que é postado, tantos nas redes sociais do projeto, como nas nossas redes pessoais.

Pensamos um passo de cada vez, muita paciência. Estamos muito preocupados hoje com o bom conteúdo, um bom roteiro, sem pressão de fazer só por fazer. Às vezes, demoramos para entregar o vídeo novo, mas não criamos uma obrigação de entregar conteúdo para o nosso público, quando vem a inspiração fazemos.

Tudo é muito bem pensado, temos o marketing como um aliado. Somos muito gratos a todos que nos ajudaram nessa nossa trajetória de quase nove anos. Sempre mandamos mensagem, mimos e citamos essas pessoas. Temos muito respeito pelo nosso público e ao final de cada espetáculo, tiramos fotos com todos. É o mínimo que podemos fazer para retribuir o carinho que eles têm com o nosso trabalho.

Uma fila gigantesca é organizada para receber todos, até o último na praça ou no teatro. Guardamos sempre parte do que recebemos para um fundo da Companhia, esse dinheiro é investido em novos projetos, novas temporadas etc.

O empreendedorismo cultural nos faz ir a frente. E não paramos no tempo, não nos acomodamos, sempre temos novidades para o nosso público. É para eles que trabalhamos.

Com mais de 30 anos de carreira, você agrega um currículo de personagens fortes e dramáticos, não é? Como surgiu essa veia para comédia?

Na verdade, desde que comecei a fazer teatro aos 13 anos, estou com 47, soma aí o tempo de teatro (risos), sou péssimo com os números, tudo que eu fazia sempre ficava engraçado. Estudei um pouco a técnica do clown, cresci numa região do Maranhão onde as pessoas são muito engraçadas, sempre irônicas e debochadas, essa observação me ajudou muito.

Fiz um espetáculo de grande sucesso chamado “Catirina” com direção de Fernando Bicudo em que eu fazia a parte cômica do espetáculo. Depois enveredei só pelo drama, sou um ator dramático, e modéstia parte consigo passear pela comédia com tranquilidade.

Um grande mestre meu de teatro ensinou que na vida a gente ri e a gente chora, senão seria insuportável a vida sem esse equilíbrio. As pessoas se acostumaram comigo fazendo drama e esqueceram que eu fiz a comédia por seis anos em “Catirina”.

Quando eu comecei a fazer “Pão com Ovo”, uma comédia de costumes, com influência do nosso conterrâneo Arthur Azevedo, as pessoas estranharam muito. E hoje grande parte do público que acompanha meu trabalho se acostumou e esqueceu que eu fazia drama.  O maranhense é um povo engraçado. O nordestino ri de si mesmo, acho isso maravilhoso, não se leva tão a sério, a gente dessacraliza muita coisa.

Foto: Divulgação

A ideia de inserir tantas críticas sociais no espetáculo, seria uma forma de dar voz ao povo nordestino?

Sim, essa necessidade é gritante. Não podemos perder essa oportunidade de criticar uma sociedade tão machista, sexista, homofóbica e preconceituosa. O humor permite isso de forma muito direta.

Hoje temos um alcance enorme de público e através do nosso conteúdo, servimos de porta voz a muitos nordestinos, sem ser panfletária ou só o lacre pelo lacre.

O nosso Facebook tem 415 mil seguidores, não podemos fazer o humor só pelo humor, temos na mão uma ferramenta muito poderosa, muita gente sendo representada em nossos vídeos ou pelo que apresentamos no palco.

Com tantos problemas enfrentados pela Cultura, você acredita na possibilidade de o governo criar políticas de fato, para expansão da arte?

Fiquei muito triste com o tratamento que o atual governo federal tem dado à cultura, a coisa ainda não engrenou e não se se vai para a frente, talvez pelas perspectivas e nomes especulados. A gente vai continuar cobrando, dando pressão. Mas não vejo muita saída, nem uma luz no fim do túnel, a luz será nós artistas que iremos acender com muita criatividade, jogo de cintura e buscando novas alternativas.

Mas a cultura é também de responsabilidade do Estado, é uma obrigação, assim como, a saúde, segurança, educação, pois não existe nação sem cultura. Estamos aí, na luta pelo fundo de Cultura. Aqui no Maranhão, tenho muitas esperanças na boa vontade da Secretária de Cultura do Estado, inclusive em relação a essa crise da pandemia. Assim que começou a quarentena, a Secretaria lançou um projeto de lives pagas para os artistas como uma forma de proporcionar renda.

Foto: Divulgação

Uma paixão?

O teatro. Quando estou no palco não sinto falta de nada, me sinto completo.

Outra relação e influência bacana que você construiu, foi essa paixão das crianças. Como é receber esse carinho?

Temos um público infantil enorme, recebemos com frequência declarações, áudios de crianças que acompanham o “Pão com Ovo”. É uma geração que vai crescer e ter nosso trabalho como referência e lembrança. É muito gratificante, quando fazemos o espetáculo em praça pública o espaço da frente do palco e toda reservada para eles, é lindo de ver. São os erês que nos dão energia e nos motiva a continuar.

Como surgiu “Pão com Ovo”? 

Surgiu dentro das empresas, fomos contratados para fazermos duas secretárias que atendiam muito mal, aí criamos a Clarisse e Dijé, fizemos por dois anos, elas pagaram muitas contas nossas (risos). Eu percebi que funciona muito e que as pessoas riam bastante. Então, resolvi fazer um roteiro e transformar em espetáculo, que já se vão quase nove anos de história.

Podemos esperar alguma readaptação para esse ano?

Esse ano estreamos o “Cabaré do Pão com Ovo”, outro grande sucesso. Fizemos doze sessões no Teatro Arthur Azevedo, todas esgotadas. É um novo espetáculo.

Foto: Divulgação

 

O povo nordestino ainda sofre muito preconceito no país. Como tem vencido essa barreira?

A internet tem ajudado muito nessa divulgação. Hoje muitos artistas nordestinos não precisam estar nas grandes mídias nacionais para fazerem sucesso.

Aqui no Nordeste temos vários exemplos, a gente mesmo coloca sete mil pessoas em praça pública, vídeos com milhões de visualizações e não estamos na grande mídia nacional.

Nós sofremos preconceitos quando fomos pela primeira vez na nossa temporada para o sudeste, mas vencemos muitas barreiras, um grupo nordestino, atores desconhecidos, um espetáculo chamado “Pão com Ovo”, homens vestidos de mulheres em um teatro de shopping da zona sul do Rio de Janeiro, “o sertanejo é antes de tudo um forte” já dizia Euclides da Cunha.

A temporada foi um grande sucesso e até prolongamos por mais 15 dias. Já estamos na nossa quarta temporada nos grandes teatros do Rio e percorrendo outras capitais do Brasil. “A vida é combate que aos fracos abate”. A barreira é vencida porque o nordestino é um povo que tem orgulho da sua cultura.

Foto: Divulgação

 Me fala da Clarisse?

Uma mulher que me ensinou muito.  O personagem me fez entender muito o universo feminino. Clarisse é uma crítica a essa classe média brasileira que se acha rica, elitista, mesmo que para isso tenha que usar grifes falsificadas para se sentir aceita. Mas que no fundo gosta mesmo é do mocotó e tem um pé na breguiça que ela tanto crítica.

Uma saudade?

Dos que já se foram para o outro plano espiritual. Saudade de um Brasil sem esse fundamentalismo religioso, saudade de uma época eu que nem pensávamos na possibilidade da volta de um poderio militar no poder. E nessa época de pandemia saudade do contato com a natureza, até porque, o   Maranhão é exuberante.

O Estado do Maranhão é bastante rico culturalmente. O que mais te encanta?

A diversidade cultural, aqui é um celeiro de manifestações populares. Para mim que sou ator é encantador essa pesquisa nos terreiros e nos arraiais. O Brasil precisa conhecer a força e a riqueza dessa cultura.

A maior dificuldade hoje é?

Receber diariamente tantas notícias ruins e não surtar. Estou me afastando de pessoas que defendem as barbaridades e a ignorância. Isso não quer dizer que não aceito quem discorda de mim, não, não é isso, é de quem é cruel, desumano. Preciso me proteger de tanta negatividade. Hoje uso muito o filtro, não do Instagram (risos) mas os filtros da vida.

 

Foto: Divulgação

Teria algum projeto novo para depois da pandemia?

Um artista não pode viver sem projetos, sem sonhos. Nunca fui de ficar só reclamando, esperando cair do céu. Eu sempre me produzi. Durante esta pandemia estamos trabalhando bastante, estamos em casa gravando vídeos para nossas redes sociais.

Estamos no palco apresentando o “Pão com Ovo” em um projeto lindo do Sesi, um caminhão vira palco e apresentamos a comédia dentro de condomínios populares. As pessoas assistem das janelas e alguma descem mantendo o distanciamento necessário. São oito apresentações desse projeto, tem sido emocionante.

Temos que driblar a crise e procurar alternativas, este mês de junho, iremos estrear um programa de rádio “Barracão do Pão com Ovo”, um sonho antigo meu de fazer rádio.

Um programa ao vivo, numa grande emissora de São Luís, de segunda a sexta, com uma hora de transmissão. O programa será todo dedicado a cultura popular do período junino, já que não haverá a festa nas ruas.

O rádio será uma nova plataforma que iremos experimentar. Quando a pandemia passar voltaremos a gravar nosso quadro semanal de humor no programa “Daqui”, na TV Mirante afiliada Rede Globo local. E temos temporada de um fim de semana em Brasília no Teatro da Unip. Os ingressos já estavam quase todos vendidos quando chegou a pandemia. Além de uma temporada de dois meses no Teatro Ruth Escobar em São Paulo, o longa metragem do” Pão com Ovo” também seria gravado agora em junho, mas temos que rever a nova data de gravação.

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