Apesar do atraso nas discussões da COP27 sobre as mudanças climáticas em Sharm El-Sheikh, no Egito, algo histórico aconteceu: os países participantes se prontificaram a estabelecer um fundo internacional para ajuda de perdas e danos por conta das mudanças climáticas no planeta. A União Europeia e os Estados Unidos apoiam a decisão após anos de atitudes evasivas quanto `a responsabilidade por emissão da maior parte dos gases por combustíveis fosseis. Isso sem contar com a China, entre outros países, que também deveria avaliar sua parte de contribuição nessa reparação. O texto é consonante com a Convenção do Clima da ONU e prevê um fundo de compensação para amortecer as consequências inevitáveis e catastróficas do aquecimento global, tais como secas e enchentes, em países mais vulneráveis como o Paquistão, por exemplo, responsável por apenas 1% da emissão total dos gases na atmosfera.
Para que o acordo se concretize, é necessário que os países em desenvolvimento também se comprometam com a redução da emissão de gases e com a transição de combustíveis fosseis para fontes mais renováveis. Isso, no entanto, não parece ser tarefa fácil, nem mesmo para os países ricos. Os países mais vulneráveis economicamente possuem um duplo desafio pela frente: ter de lidar com a transição dentro de uma economia já muito fragilizada pela pandemia da covid e ter ainda de arcar com os efeitos do efeito estufa dentro de um panorama de grande desigualdade econômica. No Brasil, por exemplo, podemos falar da existência de um racismo climático ao apontar para o fato de que a população que mais sofre com tais efeitos é aquela que vive na periferia e em locais de estrutura urbana muito precária, como morros e favelas – os riscos de enchentes, deslizamentos e desabamentos e muito maior em tais áreas. Considerando também o fato de que, devido ao nosso quadro histórico de racismo estrutural e de desigualdades cultural e social, a população negra e parda, em sua grande maioria, fica restrita a tais áreas, não fica difícil constatar a ocorrência de racismo ambiental.
Se por um lado, podemos dizer que houve um avanço benéfico com vistas `a situação dos países mais vulneráveis quanto as consequências desastrosas das mudanças climáticas, por outro, novos desafios se colocam quanto a transição do processo. Alguns desafios externos dizem respeito `a efetivação desse acordo em termos práticos: a ajuda financeira deve chegar, nas situações de calamidade, aos países atingidos; alguns desafios internos dizem respeito, no caso do Brasil, não somente `a transferência de tal fundo financeiro `a população atingida por tragédias climáticas, mas sobretudo ` reversão de tal quadro de desigualdades e de racismo ambiental.