Aula de Fonética e Fonologia é espaço aberto para análises e para um olhar mais atento e respaldado por teóricos que estudam o assunto. Sabedor disso, meu caro professor Claudio Cezar Henriques, cuja competência o faz adotar o livro ‘Fonética, Fonologia e Ortografia’, de sua autoria, em suas aulas, propôs à sua turma de pós a elaboração de uma crônica linguística que aborde qualquer assunto de fonética. Diante dessa tarefa, extremamente proveitosa aos que ganham a vida lecionando e que, em sua labuta, deparam-se com textos em que há exemplos díspares de uso de nossa “inculta e bela Flor do Lácio”, dei início à minha empreitada, buscando uma forma bem didática de tratar o apagamento do R final em verbos.
Descobri, para minha surpresa, que essa eliminação do R final, que aos usuários do Português Brasileiro (PB) parece ser fruto do excessivo uso de redes sociais, é um fenômeno antigo no português do Brasil; sendo, em remotos tempos, delimitado aos falares inculto. Será que todos sabem que Gil Vicente, poeta e dramaturgo português, fez uso dessa situação em peças teatrais para singularizar o linguajar dos escravos? Duvido. Infere-se que esse fenômeno antiquíssimo, já que me refiro a peças do século XVI, não é algo da modernidade, sendo hodiernamente trivial na fala e na escrita de vários estratos sociais. Logo, o que era restrito a um estrato social não o é mais. Alguém duvida de que é prova de que a língua está em constante mudança?
Reflexões à parte, suprimir a letra R, cuja representação fonética varia de região para região é algo que acontece com extrema frequência. Quem nunca se deparou com um texto de um amigo que escreveu, pelo WhatsApp, “Não posso atendÊ agora!”? Trata-se, portanto, de um feixe de registros em que é possível perceber que os usuários do português brasileiro não têm domínio do que se deve fazer com o R final de verbos que estão no infinitivo. Apenas à guisa de exemplificação, têm-se a palavra amor, em que é possível realizar, nos termos de HENRIQUES (2015, p.27), “uma grande quantidade de alofones para o ‘r’ forte”, indo desde o R retroflexo, típico de um falante do interior de Minas e São Paulo, até a ausência desse fone [R] no falar carioca.
Após algum tempo de pesquisa em textos que tratam dessa supressão do R final, colhi as seguintes constatações: as formas verbais infinitivas estão apoiadas na oralidade; independentemente da faixa etária e do grau de escolaridade, há o apagamento do –r nas formas verbais infinitivas na escrita de pessoas de ambos os sexos; os usuários do PB usam um acento agudo, a fim de indicar um prolongamento da vogal nos verbos de 1ª conjugação e, o circunflexo nos de 2ª; já os verbos de 3ª conjugação se apresentam sem nenhuma marcação, quando são registrados sem o –r final. Outrossim, na escrita virtual, a letra –h também é uma opção para marcar o prolongamento da vogal pronunciada com mais intensidade no final. Por fim, vale salientar que o apagamento do R final tem sido considerado um caso de mudança de baixo para cima que, ao que tudo indica, já atingiu seu limite, e é hoje uma variação estável, sem marca de classe social.