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Deleite Linguístico: O arquiteto e seus projetos linguísticos

Língua Portuguesa e arquitetura dialogam. Sim, meus caros! É possível fazer uma correlação entre o arquiteto e o usuário da língua, já que ambos precisam projetar suas obras que podem beneficiar alguém ou toda a sociedade. Quanta responsabilidade! Imaginem ter um amigo arquiteto cujo hobby é observar o uso do Português! 

Em um dia chuvoso, eu e o arquiteto Cesar Vieira almoçamos e falávamos das construções de Copa após uma aula da pós à qual assistimos. Entre uma consideração e outra, Cesar fez um comentário linguístico que me levou a exercer minha profissão de professora! Rapidamente projetei o conteúdo da aula em um quadro branco, construído pelos guardanapos do restaurante. O tema foi o emprego do hífen. Como recurso pedagógico, escolhi palavras do campo semântico da profissão dele. Saibam vocês que arquiteto é palavra composta por arkhê, que significa “primeiro”, “principal” , e tekton, “arquiteto-chefe”. Uau! Ter um amigo arquiteto que ama nossa língua  e que divide a sociedade da empresa “Modo Construtora” com Paulo Darcy, igualmente amante do Português, não é um luxo? Iniciei a “aula” com as palavras compostas “matéria-prima”, “azul-claro”, “para-raios”, “primeiro-elevador”, explicitando a ele a regra que consta da Base XV do Acordo Ortográfico. Expliquei-lhe que, sendo palavras compostas por justaposição sem ter um elemento de ligação (normalmente uma preposição) e tendo o primeiro termo formado por substantivo (matéria), adjetivo (azul), verbo (para) e numeral (primeiro), o hífen é crucial. Fiz o contraponto com “mão de obra”,cujo elemento de ligação “de” leva à ausência do hífen. Entendida essa parte, criei uma forma simplificada para meu “aluno” que demonstrava desejo de a aula se prolongar. Disse a ele:- Cesar, guarde estes dois provérbios: “Dois bicudos não se beijam” e “Os opostos se atraem”. Ele ficou à espera de uma lógica, mas percebeu a facilidade em “micrO-Ondas” e “supeR-Resistente”, já que nelas a última letra da primeira palavra é idêntica à primeira letra do segundo termo, tornando o hífen necessário. Já em “autOEscola” e “inteRMunicipal”, a última letra do primeiro termo é diferente da primeira letra do segundo. Sendo assim, não há hífen. Cético da facilidade que acabara de assimilar, lançou-me um desafio: – Como explicar “ultrassonografia” e “semirreta”? Mostrei-lhe que precisaria respeitar a fonologia. Na união dos termos, para manter o som do “s” e “r”, tive de dobrar essas letras. Para finalizar, ensinei-lhe que, tendo o primeiro termo um acento, o hífen é obrigatório, como em “pré-projeto” e “pós-obra”.

Já que a chuva dera uma trégua, “sem-cerimônia” (Guardem que infelizmente quem está “sem” ou é “vice” recebe hífen. Só mesmo nós dois, vascaínos, sabemos isso), findei nossa aula, ciente de que transferi conhecimento a um arquiteto cujo prestígio é inegável!

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RESPIRARTE - 07 JAN 25