Jornal DR1

Em crise, Cuba abre economia para capital estrangeiro

Foto: Reuters

Com economia abalada por crise crônica, regime da ilha anuncia pacote de incentivos que inclui menos burocracia e mais flexibilidade em contratações para tentar atrair investidores estrangeiros.

Cuba está abrindo sua economia ao capital estrangeiro, como foi confirmado pelo ministro do Comércio Exterior e do Investimento Estrangeiro, Oscar Pérez-Oliva, durante a Feira Internacional de Havana, no fim de novembro.

Diante de empresários e investidores de diversas partes do mundo, o ministro anunciou um pacote de medidas para facilitar os investimentos estrangeiros, o que representa uma mudança paradigmática em vários aspectos.

Cuba enfrenta uma profunda crise econômica há vários anos, provocada pelo colapso do turismo após a pandemia de Covid-19 e pelo duradouro embargo comercial, econômico e financeiro dos Estados Unidos, fatores que agravaram problemas estruturais da economia cubana.

A infraestrutura pública e os serviços básicos vêm se deteriorando. Apagões que duram horas tornaram-se frequentes. O país precisa importar grande parte de seus alimentos, além de combustível e peças de reposição para suas usinas termelétricas obsoletas.

Para gerar as divisas estrangeiras de que tanto necessita, Cuba tem gradualmente “dolarizado” sua economia nos últimos anos, processo que inclui o varejo, empresas estatais de importação, postos de combustíveis e o setor de turismo.

Esse movimento deve continuar, enfatizou Pérez-Oliva. Ele anunciou que determinados bens e serviços passarão a exigir pagamento em moeda estrangeira, sem entrar em mais detalhes. Segundo o ministro, o pacote de medidas tem como objetivo tornar os investimentos estrangeiros mais dinâmicos, confiáveis e com maior autonomia financeira.

As mudanças anunciadas representam o passo mais significativo rumo à abertura da economia cubana em anos. O governo, no entanto, não informou quando elas entrarão em vigor.

Cuba abriu-se ao capital estrangeiro há mais de uma década, na tentativa de impulsionar a economia e atrair novas tecnologias. Em Mariel, nos arredores de Havana, foi criada, no fim de 2013, uma zona especial de desenvolvimento com regulamentações alfandegárias e tributárias mais favoráveis. No ano seguinte, entrou em vigor uma nova lei sobre investimento estrangeiro.

Apesar disso, os resultados ficaram abaixo das expectativas, devido a processos de aprovação lentos, entraves burocráticos e ao endurecimento das sanções dos EUA, que impediram investimentos de grande escala no país.

Agora, o regime tenta melhorar as condições para os investidores estrangeiros. Segundo Pérez-Oliva, os processos serão mais simples, flexíveis e transparentes. A proposta é permitir que investidores assumam indústrias e instalações de produção subutilizadas, invistam nelas por um período determinado, obtenham lucros e, posteriormente, as devolvam ao Estado.

O objetivo é aumentar a produção nacional, ampliar as exportações e substituir importações. Combustíveis e alimentos seguem sendo as principais importações do país. “Grande parte dos alimentos que importamos poderia ser produzida em Cuba”, reconheceu o ministro.

Em um projeto piloto, uma empresa vietnamita está cultivando arroz em terras cedidas pelo Estado cubano na província de Pinar del Río. Caso os resultados sejam positivos, o modelo será ampliado para outras regiões.

Outro projeto piloto envolve o arrendamento de hotéis a redes internacionais, concedendo maior liberdade operacional. Segundo Pérez-Oliva, essa iniciativa também pode servir de modelo.

Cuba ainda está abrindo o setor bancário e financeiro ao capital estrangeiro e pretende promover ativamente essa participação. O ministro também anunciou um novo instrumento de financiamento, sem fornecer detalhes.

Para o economista Omar Everleny Pérez Villanueva, da Universidade de Havana, as medidas representam um passo na direção correta, especialmente pela agilização dos processos de aprovação. “Isso mostra que existe uma certa vontade política”, afirma.

Villanueva ressalta que, diante do alto nível de endividamento público, os investimentos estrangeiros são praticamente a única forma de Cuba acessar fontes externas de financiamento. No entanto, ele avalia que as medidas ainda são insuficientes, considerando o atual estado da economia e a pressão exercida pelo governo dos EUA sobre possíveis investidores.

Entre os pontos que poderiam avançar mais, o economista cita a agência estatal de emprego, historicamente criticada por empresas estrangeiras. Essa prática será flexibilizada: a agência continuará existindo, mas as empresas também poderão contratar trabalhadores diretamente e pagar bônus em dólares.

“Trata-se de um elemento importante de flexibilização. Após o processo de seleção feito pela entidade empregadora, o investidor decidirá se a contratação será direta ou por meio da agência estatal”, explicou Pérez-Oliva.

“Isso facilita muito as coisas”, avaliou o empresário alemão Frank Peter Apel, da Pamas, fornecedora de serviços hidráulicos e única empresa alemã com filial na Zona Especial de Desenvolvimento de Mariel. Para ele, as mudanças refletem a gravidade da crise no país e demonstram disposição para reformas.