Por Sandro Barros
França, país de protestos de rua e revoltas espontâneas, já levava anos sem ver uma mobilização social como a que ocupou as ruas das principais cidades do país nos dias 5 e 6 de novembro. Centenas de milhares de franceses realizaram greve contra a reforma da Previdência, enquanto setores estratégicos, como os transportes, deram início à paralisação que se prolongaria nos dois dias seguintes. O presidente, Emmanuel Macron, atingido pela revolta dos ‘coletes amarelos’ há um ano, busca uma resposta à crise sem renunciar ao projeto central de seu governo.
Ninguém conhece os detalhes da reforma previdenciária na França, mas as linhas mestras já reveladas bastaram para desencadear uma das maiores mobilizações dos últimos anos. A greve maciça no transporte ferroviário marcou o início da primeira jornada de protestos. As paralisações, que afetam outros setores, como a educação e a aviação, conturbaram o cotidiano de Paris e das principais cidades. Estima-se que 90% das ferrovias de longa distância deixaram de funcionar em toda a França, assim como 80% dos trens de subúrbio. Na capital, 11 linhas de metrô foram fechadas. Marselha, Lille, Bordéus, Nice e Estrasburgo tiveram o transporte público reduzido.
O transporte é a espinha dorsal de uma greve que, embora longe de ser geral, tem um impacto generalizado: sem trens nem metrôs, a atividade das grandes cidades forçosamente se vê alterada. Mas não é o único setor mobilizado. Em toda a França, 55% dos professores de escolas primárias e pré-escolares aderiram à greve, chegando a 78% em Paris, segundo dados do Ministério da Educação. Previa-se a anulação de 20% de voos. A greve na imprensa deixou os quiosques sem os jornais do dia, e a Torre Eiffel fechou. Foram mais de 245 manifestações ou concentrações convocadas em todo o país. O objetivo dos responsáveis pela convocação dos protestos foi fazer uma demonstração de força na rua.
A mobilização desta quinta-feira, que não conta com o apoio da principal central sindical, a CFDT, é só o começo. A greve contra a reforma das aposentadorias continua na França e trens e metrôs foram bloqueados no dia 8. E mobilização continuou no dia seguinte e as empresas que gerenciam o transporte em Paris recomendaram aos passageiros que evitem as estações. Em entrevista hoje ao Jornal do Domingo, Philippe Martinez, representante da CGT, um dos maiores sindicatos franceses, disse que o movimento só vai ceder se o governo francês voltar atrás nas medidas anunciadas.
Em entrevista ao Jornal do Domingo, Philippe Martinez, representante da CGT, um dos maiores sindicatos franceses, disse que o movimento só vai ceder se o governo francês voltar atrás nas medidas anunciadas. Para o líder sindicalista, o projeto do presidente Emmanuel Macron não traz “nada de bom.” Segundo ele, é preciso conservar o sistema atual, que, em sua opinião, “é o melhor do mundo”, e “melhorá-lo”.
O princípio do atual sistema francês, segundo o sindicalista, é que os trabalhadores paguem de acordo com seus ganhos, recebendo, no fim, “o suficiente para satisfazer suas necessidades”. O projeto do governo, explica Martinez, acaba com a redistribuição e considera que os franceses que não poderão pagar pelo benefício, como em caso de desemprego, por exemplo, devem ganhar menos. A proposta do Executivo visa reunir em um só sistema universal 42 regimes de aposentadoria diferentes, a partir de 2025. As paralisações poderiam se prolongar até 12 de dezembro, possível data em que o governo detalhará as propostas da reforma.