Jornal DR1

Infidelidade

Ingrid era casada há 28 anos e tinha dois filhos crescidos que moravam fora da pequena e quase tranquila cidade. A monotonia da vida conjugal foi bruscamente interrompida quando conheceu o jovem e divertido Honorato num despretensioso passeio ao ar livre. No começo, a infidelidade demonstrou, por incrível que possa parecer, fortalecer o casamento, uma vez que ela passou a sentir-se   novamente bela, desejada e com elevada autoestima.

Os primeiros e perigosos encontros com ele aconteceram numa arborizada cidade vizinha e se davam nos horários mais inesperados, para despistar as sucessivas ausências do trabalho e as escapulidas dos entediantes jantares domésticos com o marido folgazão. O sexo era arrebatador nestas ocasiões voluptuosas e Ingrid tinha que se controlar para não fraquejar e demonstrar toda a ansiedade que sentia antes das delícias no motel Afrodite.

Mas, o entusiasmo inicial foi ao poucos transformando-se num ritual burocrático e fastidioso, parecido com o decrépito casamento. Não foram poucas as vezes em que ela inventou desculpas para desvencilhar-se do amante, alegando dor de cabeça na última hora ou mesmo desculpando-se pela sobrecarga excruciante no trabalho como advogada criminalista.

Honorato, por sua vez, era um apaixonado e sofria imensamente com as desditas da amante, ainda que tenha mantido discrição e sigilo nos oito anos do relacionamento. Mas, a esposa estava cada vez mais decidida a terminar o caso com o jovem lutador de judô, quando numa tarde ensolarada e calma recebeu mensagens no celular. Era o rapaz, dizendo que estava exausto daquela situação desconfortável e não queria mais se prender a alguém que claramente não o desejava com a mesma intensidade que ele.

Instantaneamente, o WhatsApp e o Instagram de Honorato foram bloqueados, para o desespero dela que, surpreendida pela notícia, desatou a chorar e a tremer, sofrendo pela inabitual rejeição. 

E teve ciúme, muito ciúme. Será que havia outra mulher, provavelmente mais jovem e mais bonita, usurpando o seu lugar? 

Durante meses, Ingrid correu atrás de Honorato. Fez plantão em frente da sua casa, tentou ligar, mandou recados através de conhecidos, mas tudo em vão, o jovem estava irredutível na sua obstinação por terminar o caso. O tempo passou, o ressentimento aos poucos foi abrandando e ela quase havia esquecido o garotão charmoso, quando numa madrugada solitária em frente da TV, reconheceu o antigo amado preso pela polícia. Honorato era o chefe de uma perigosa facção criminosa que incendiou a pacata cidade onde moravam, na tentativa de assaltar o Banco do Brasil. Houve reféns, tiros e mortes, um verdadeiro horror de guerra!

No dia seguinte, Ingrid usou de suas prerrogativas como advogada criminalista e foi visitar o meliante na cadeia. Mal entrou na cela, olhou-o nos olhos vorazmente, desnudou-se por completo e caiu nos seus braços tatuados como fazia antigamente. O sexo foi maravilhoso e escandaloso como da primeira vez em que se permitiram o fatal desejo da carne.

Quando saiu do presídio amurado e sombreado, parou um instante e meditou longamente, tentando encontrar resposta para a pergunta que os seres humanos vêm fazendo pelos séculos afora: 

– Por que o proibido, o socialmente proibido, é tão incrivelmente sedutor?

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