Milton Nascimento é um dos nomes mais reverenciados da música brasileira. Com uma voz inconfundível, capaz de atravessar gerações e fronteiras, ele construiu uma carreira marcada por sensibilidade, experimentação e compromisso artístico. Nascido no Rio de Janeiro em 26 de outubro de 1942, foi criado em Três Pontas, no interior de Minas Gerais, por uma família adotiva, após perder a mãe biológica ainda pequeno. Foi nesse cenário mineiro que sua identidade musical começou a ser moldada, entre montanhas, serenatas e encontros que mais tarde fariam história.
Sua trajetória artística começa a ganhar corpo nos anos 1960, quando se muda para Belo Horizonte. Lá, conhece os músicos Lô Borges, Beto Guedes, Wagner Tiso, Toninho Horta, entre outros, com quem fundaria o movimento musical conhecido como Clube da Esquina. O coletivo, que unia MPB, jazz, rock progressivo e música latina, rompeu padrões estéticos e se tornou uma das iniciativas mais inovadoras da música brasileira. O disco Clube da Esquina (1972), assinado por Milton e Lô Borges, é até hoje referência internacional e figura em diversas listas de melhores álbuns da história da música.
Antes disso, no fim da década de 1960, Milton já chamava atenção em festivais. Em 1967, ficou nacionalmente conhecido ao defender a canção “Travessia”, em parceria com Fernando Brant, no Festival Internacional da Canção da TV Globo. A música conquistou o segundo lugar e alçou o cantor ao estrelato. Foi o início de uma longa e fecunda colaboração com Brant, responsável por sucessos como “Canção da América”, “Maria, Maria” e “Encontros e Despedidas”.
Ao longo de sua carreira, Milton lançou mais de 30 álbuns e gravou com nomes de peso da música mundial, como Wayne Shorter, Herbie Hancock, Paul Simon, Peter Gabriel, James Taylor e Mercedes Sosa. Foi também pioneiro ao usar sua música como forma de denúncia social, especialmente durante a ditadura militar brasileira. Canções como “Coração de Estudante” se tornaram hinos de resistência e liberdade.
Milton também é um dos artistas brasileiros mais premiados internacionalmente. Recebeu quatro prêmios Grammy, incluindo o Grammy Latino de Melhor Álbum de Música Popular Brasileira e o prêmio à Excelência Musical, entregue em 2000. No Brasil, foi condecorado com o Prêmio Shell de Música em 2002, além de homenagens em festivais e instituições culturais. Em 1997, foi declarado Patrimônio Cultural de Minas Gerais.
Apesar da fama, o artista sempre manteve uma postura discreta, evitando os holofotes fora do palco. Sua música, no entanto, sempre falou alto. O timbre agudo, quase celestial, é seu cartão de visitas, capaz de emocionar mesmo sem palavras. Como disse Elis Regina, com quem gravou a emblemática “Cais”, Milton é “uma entidade musical”, cuja obra não se encaixa em rótulos.
Em 2022, aos 80 anos, o cantor anunciou sua aposentadoria dos palcos com a turnê “A Última Sessão de Música”. Com ingressos esgotados em diversos países e aplausos calorosos, a despedida foi mais uma confirmação do seu legado. Mais do que um cantor ou compositor, Milton Nascimento é um símbolo da profundidade da música brasileira — uma voz que une o sagrado e o popular, que canta o amor, a amizade e a esperança.