Jornal DR1

O que se pode fazer para um 2020 melhor?

SAÚDE
Atenção primária como prioridade
Mariana Zau, médica

Cresci no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, e como ideologia decidi fazer a residência de Medicina de Família, exatamente onde vivi a maior parte do tempo, em 2015, pela Prefeitura do Rio. Começava a minha jornada de médica residente.

Tínhamos todo o suporte que um médico precisa ter. A atenção primária era tratada como prioridade, já que em média 85% dos problemas de saúde podem ser resolvidos nas clínicas da família, sem a necessidade de encaminhamento. Hospitais eram para casos graves e aprendíamos a importância da medicina preventiva e social.

Hoje me deparo com uma situação muito triste: não temos insumos; faltam medicamentos básicos, como analgésicos; faltam especialistas e, assim, as filas do Sisreg aumentam cada dia mais; nossos salários atrasados há quase três; nossos benefícios sendo cortados e nossos colegas de profissão precisando de cesta básica. Me deparo com o caos e compartilho lágrimas.

Não venho falar aqui sobre política. Venho falar do que vivi e estou vivendo. Muita coisa mudou desde iniciei minha jornada como médica de família, mas a única coisa que não mudou foi minha esperança de que novamente um dia a atenção primária seja vista como prioridade e não como opção.

CULTURA
Pela volta do Ministério da Cultura
Tunai, cantor e compositor

Se a arte reflete a vida, a vida somos todos nós! A música, literatura, cinema, artes plásticas, teatro, dança, artesanato e tantas outras formas de se fazer arte, que são imprescindíveis pra se viver, para se ter o conhecimento, abrir a mente das pessoas… Ela educa, alimenta e quanto mais oportunidades para torná-la viável em sua execução, é preciso ir mais além. É tão complexo que, em todo país civilizado, existe uma instituição formada por pessoas cultas como artistas, intelectuais, empresários, professores, empreendedores, etc., com uma visão clara de “como fazer”.

Exatamente por isto criou-se o MINC (Ministério da Cultura), em 1985, com a iniciativa, principalmente, de José Aparecido de Oliveira, Fernanda Montenegro, Celso Furtado e Ângela Gutierrez, entre outros. Então, o meu desejo para o ano 2020 que se aproxima é que a gente tenha de volta o Ministério da Cultura que, além de ser fundamental para o país, traz não só as benesses do conhecimento, mas também divisas popularmente chamadas de dinheiro, bufunfa, grana, etc., num momento em que só se fala nisso, mas, a meu ver, na contramão da história. Que o bom senso prevaleça e venha junto com o ano que se aproxima.

SEGURANÇA
Esperança segura
Guilherme Carvalhido, cientista social

Nos últimos 40 anos, a região metropolitana do Rio de Janeiro vem sofrendo um aumento quantitativo da violência pública. Os motivos são variados: crises econômicas, descaso governamental, falta de políticas públicas, desesperança, revoltas… Enfim, motivos não faltam para justificar. Porém, as soluções foram sendo postergadas ou não pensadas, havendo apenas ações paliativas, intencionando diminuir o sofrimento da população carioca e fluminense.

Temos que lembrar que as crises públicas do Rio de Janeiro não estão concentradas apenas na segurança, mas também nos índices de empregos, na qualidade do atendimento na saúde, nos resultados educacionais, entre outros. Mas a segurança interfere muito na percepção do cidadão da sua qualidade de vida, tornando-se uma característica fundamental do cotidiano público. Nas últimas eleições foi o assunto principal dos candidatos, apresentando inúmeras promessas não cumpridas ou deixadas sem planejamento pelos governos.

Como a vida anda para frente − sem esquecer o passado, cabe uma reflexão para o futuro próximo sobre a segurança pública. Para termos uma vida melhor, não devemos nunca perder a esperança de melhorias. Mas só isso não basta: é preciso planejamento de políticas públicas com foco no cidadão. O que isso significa? Agir sobre os espaços das cidades com o mínimo de violência. Pois, no ano de 2019, houve alguma redução dos índices de violência, o que deixa margem para as forças de segurança negociar suas práticas com as comunidades organizadas, buscando agir cirurgicamente sobre os grupos marginais, visando impedir que os meliantes criem barreiras humanas e sociais para seus atos criminosos.

E como fazer isso? Agindo com práticas sociais e culturais, construindo alternativas lucrativas para que o morador perceba que o local onde ele vive tem organização suficiente para ele andar sem ficar com medo de grupos paralelos que impõem violência.

Logo, temos que cobrar dos governos ações neste sentido, pois em locais onde houve redução significativa da violência sempre houve políticas públicas inclusivas dos cidadãos, visando diminuir a atuação de criminosos.

SOCIAL
Onde vive a cidadania brasileira?
Silvério Morón, projeto Adote um Aluno

Antes de responder definitivamente a pergunta do título do meu texto, devo narrar uma ‘ficção’ verdadeira, criada pelo meu sentimento. Anos atrás, um jovem porquinho chamado Voluntário, se apaixonou por uma linda porquinha de nome Cidadania. A partir desse momento, só andavam de mãos dadas e resolveram viver juntos num lindo bosque próximo de um riacho. Tiveram três filhotes chamados: Aceitação, Bondade e Limpinho, formando uma família perfeita.

Do outro lado do riacho surgiu uma família de lobos maus, cujos pais chamavam Corrupto e Ganância, também com três filhotes: o Ignorante, o Sujinho e o Ruinzinho, uma família autoritária e egoísta. A primeira atitude do senhor Corrupto foi proibir que a família dos porquinhos usassem o riacho, alegando que o mesmo pertencia às suas terras e que só a sua família poderia desfrutar daquelas águas. Como toda família de lobo mau, era muito preguiçosa, sempre passavam dificuldades na alimentação.

Já a terra dos porquinhos, casa vez mais produtiva, tudo que se plantava e prosperava. Dona Cidadania, diariamente, preparava uma cesta de alimentos e fazia que chegasse do outro lado da margem próximo a moradia dos lobos maus. Pela primeira vez Dona Ganância se emocionou com a atitude de Dona Cidadania e aceitou o convite para almoçar na casa dos porquinhos.

Num encontro memorável de confraternização, foi selada a paz e o respeito entre as famílias, que resolveram batizar o bosque onde viviam com a primeira letra do nome dos filhotes: Brasil.

Essa pequena ficção nos leva a uma reflexão da importância do voluntariado e da cidadania em nosso país que estão tão adormecidos. A cidadania brasileira vive no coração de todo voluntário, que doa sem interesse de receber, ou seja, a união do povo brasileiro é o remédio para curar o Brasil em 2020!

MEIO AMBIENTE
Participação cada vez mais ativa
Carolina Rodrigues Ribeiro, professora de História e Ciência Política

Nos últimos tempos, a preocupação com o meio ambiente tem aumentado, tornando-se uma das pautas mais urgentes em se tratando de políticas globais. No Brasil esse assunto está ligado a episódios de descasos e retrocessos envolvendo o poder público. Rompimento de barragens e consequente contaminação dos rios por rejeitos de minério, queimadas na floresta amazônica, vazamento de óleo nas praias do Nordeste e liberação desenfreada de agrotóxicos são alguns dos acontecimentos que suscitaram calorosos debates acerca da questão socioambiental no Brasil e que deixaram um clima de pessimismo pairando no ar. Mas, será que não podemos esperar nada de bom para 2020 quando o assunto é meio ambiente?

A resposta é mais otimista que supomos. Segundo pesquisa realizada pela empresa Toluna em parceria com a Fundação Getúlio Vargas, em novembro de 2019, 75% das pessoas entrevistadas disseram ter transformado de alguma forma seus hábitos por preocupação com questões ambientais. Questões como sustentabilidade e impactos ambientais sobre a saúde têm afetado diretamente as decisões de consumo dos brasileiros, o que expressa um maior comprometimento com as causas ambientalistas.

Hoje há um maior engajamento da população em movimentos voltados à sustentabilidade, preservação do meio ambiente, fiscalização ambiental, conservação de espécies, preservação da vida e cultura indígena e uso racional dos recursos naturais.

Dessa forma, o que podemos esperar para 2020 é que a participação cada vez mais ativa da sociedade civil nos processos de transformação socioambiental levem a decisões mais acertadas pelo governo, a ações ambientais mais responsáveis por parte das empresas e a um direito ambiental mais efetivo.

ECONOMIA
Contra o atraso de um ano
Gilberto Braga, economista

No início de 2019 a expectativa para o desempenho da economia era maior do que o que ocorreu. A troca do poder, com a eleição de Jair Bolsonaro e a formação de uma equipe econômica de reconhecida competência no mercado animou os especialistas e investidores. As propostas de reformas, principalmente a da Previdência, agradaram, mas a agenda política complexa, a dificuldade no trato com o Congresso e as declarações confusas e contraditórias do presidente e de seus ministros, mantiveram a recuperação econômica em “banho-maria”.

Quando muitos já desconfiavam da capacidade do Governo em destravar a agenda econômica, ela avançou, com a aprovação da reforma da Previdência e abriu espaço para propostas de reformas administrativa e tributária. Aos trancos e barrancos a equipe econômica se manteve íntegra em seus propósitos, sem perda de colaboradores chaves (um fato raro na gestão Bolsonaro) e fecha 2019 com um pequeno crescimento do PIB, ao redor de 1%, com os menores juros reais da história e com a inflação sobre controle, provavelmente em 3,5%.

Com esse quadro, pode-se esperar um 2020 melhor na economia, mesmo com as dificuldades no Congresso. A geração de empregos de maior qualificação e remuneração já dá sinais de uma pequena retomada, com inflação ainda sobre controle e juros baixos. Um crescimento do PIB entre 2,2% e 2,5% é possível. O dólar, mesmo volátil, não é um problema grave para o país.

Para o Rio de Janeiro, apesar da gestão caótica da Prefeitura, por ser ano eleitoral, 2020 deve forçar o alcaide a mostrar algum serviço. Na órbita estadual, a retomada dos investimentos no setor de petróleo deve trazer algum alívio às finanças.

Por isso tudo, muitos economistas acham que apesar de estarmos entrando em 2020, muitos economistas brincam que 2019 começará agora. Porque, se tudo der certo dessa vez, teremos em 2020 na economia, o que era esperado para 2019.

EDUCAÇÃO
Há uma luz no fim do túnel
Waleria de Carvalho, professora e jornalista

Educar é muito mais do que transmitir conhecimentos e informações aos alunos em sala de aula. Transcende os muros das unidades escolares e é uma eterna montanha russa de emoções, sejam boas ou ruins. Ao professor não cabe apenas a tarefa de ensinar, mas a de formar cidadãos para um futuro melhor e mais promissor. Na sociedade atual os profissionais da Educação enfrentam vários obstáculos como famílias desajustadas, política educacional ruim e uma economia que deixa milhares de pais de famílias desempregados.

O resultado negativo acaba chegando a patamares muito elevados, como é o caso do PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos). Dados de 2012 apontam o Brasil, ao lado do Peru, Colômbia e Argentina, como um dos países com pior rendimento em matemática, leitura e ciência, segundo relatório divulgado pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), em Paris, que avaliou a situação de 64 nações. De acordo com o levantamento, 1,1 milhão de estudantes brasileiros com 15 anos não compreendem o que leem nem tem conhecimentos essenciais de matemática e ciências.

Apesar de muita assustadora a situação no ensino brasileiro, ainda acredito numa luz no fim do túnel, principalmente quando vejo professores comprometidos com os seus alunos e com os diversos projetos do setor em que trabalho há cerca de 10 anos na Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, a maior de toda América Latina, com 1.540, escolas, 635 mil e 346 alunos, 38 mil e 198 professores e 16 mil e 269 funcionários de apoio.

Na Coordenação de Projetos de Extensão Curricular (CPEC) trabalhamos no contraturno e no pós-turno com os viés de esportes, artes, cultura, sustentabilidade, educação e gênero. Percebo que quando a arte e o esporte estão inseridos nas escolas o aluno melhora as notas, o comportamento, e fica mais disciplinado. É de suma importância que nossos governos, tanto na esfera federal, estadual e municipal, tenham um olhar todo especial para a Educação, pois somente por meio dela poderemos ter um Brasil mais justo e igualitário.

ESPORTES
Por mais projetos de incentivo ao esporte nas escolas
Flavio Soares, professor de Educação Física

Quando se fala em vida saudável, não se tem dúvidas que o esporte se torna algo essencial para que isso aconteça. Além de proporcionar uma melhor qualidade de vida ao ser humano, outros benefícios incontestáveis que a prática proporciona são a inclusão social, a manutenção do peso e força muscular, aumento da concentração, além de reduzir o estresse e a depressão e assim aumentando a autoconfiança, entre muitos outros.

Segundo a ONU um maior investimento no esporte pode impactar diretamente na luta contra o racismo, no incentivo à tolerância, no impacto social em locais menos favorecidos e ainda na melhora das condições de saúde da população.

É de extrema importância investir em cidades mais ativas, com mudanças de hábito para que se alcance um estilo de vida mais saudável, de maneira a prevenir doenças e reverter o quadro alarmante da saúde dos brasileiros. E os nossos governantes têm papel fundamental nisso.

Mas infelizmente não é isso que vemos. Cada vez mais a prática do esporte vem diminuindo entre as crianças. A falta de ídolos de grande expressão, e há pouco ou até mesmo nenhum incentivo de nossos professores nas escolas, muitas vezes por falta de estrutura e material para a prática do esporte.

A tecnologia tem favorecido a falta de interesse das crianças e adolescentes. Muitos profissionais de educação física relatam que os alunos estão aparecendo para as aulas com redução das capacidades físicas e déficits motores básicos, como correr, deslocar-se com destreza, entre outros, o que, provavelmente, é consequência da falta de exercícios físicos.

Precisamos com urgência de mais projetos de incentivo ao esporte nas escolas, de mais verbas destinadas a programas da terceira idade, de melhorias e criações de espaços públicos para a prática de atividades físicas. Muitas vezes o problema não é o incentivo, mas a má gestão e aplicação dos recursos por seus gestores. Continuemos na luta.

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