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Ubirajara Fidalgo, um legado de arte, resistência e afeto

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Professor, escritor, cineasta e referência na luta antirracista, Fidalgo deixou marcas profundas na cultura negra brasileira

Ubirajara Fidalgo foi mais do que um nome importante na cultura brasileira — foi um farol para muitas gerações que encontraram nele um exemplo de intelectualidade negra, resistência e afeto. Nascido no subúrbio do Rio de Janeiro, ele construiu uma trajetória marcada por múltiplos talentos: professor dedicado, cineasta engajado, escritor atento e um militante apaixonado por justiça social e pela valorização da identidade negra.

Ao longo de décadas de atuação, Bira, como era carinhosamente chamado, usou todas as ferramentas ao seu alcance para contar as histórias que o Brasil insistia em esconder. Foi pioneiro ao criar espaços de debate sobre a cultura afro-brasileira, sobretudo por meio do cinema e da educação. Em suas aulas, palestras e obras audiovisuais, falava sobre ancestralidade, empoderamento e memória com a sensibilidade de quem viveu na pele os efeitos do racismo estrutural — mas escolheu a luta como resposta e o amor como linguagem.

Entre suas contribuições mais marcantes está sua atuação no Grupo de Teatro Experimental do Negro (TEN), fundado por Abdias do Nascimento, onde pôde aliar arte e política de forma transformadora. No cinema, dirigiu e participou de produções que deram visibilidade às questões raciais sob a ótica dos próprios protagonistas. Também foi figura central no movimento negro nos anos 1970 e 1980, participando de iniciativas que buscavam consolidar uma identidade afro-brasileira digna e reconhecida.

Intelectual negro e militante da arte e educação

Ubirajara acreditava no poder da educação como instrumento de mudança. Durante sua trajetória como professor, foi mentor de jovens que hoje seguem seus passos como artistas, pensadores e militantes. Seus escritos revelam um pensamento profundo e crítico sobre o papel do negro na sociedade brasileira, desafiando estereótipos e propondo novas formas de representação e pertencimento.

Sua ausência física, ocorrida em 2021, deixou uma lacuna imensa, mas seu legado permanece vivo nas rodas de conversa, nos filmes preservados, nos livros que escreveu, nas sementes que plantou em cada aluno e artista que cruzou seu caminho. Ubirajara Fidalgo é eterno justamente porque entendeu que a cultura é mais do que um palco ou um quadro negro — é território de resistência.

Hoje, ao revisitar sua obra e sua história, somos convidados a enxergar o Brasil com os olhos de quem nunca se calou diante da injustiça. Ubirajara não foi apenas um homem à frente do seu tempo, foi o tempo inteiro necessário. E sua voz, como ele mesmo defendia, continua ecoando — entre o samba, o cinema, a palavra e a luta.