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Carnaval de ‘Alma Lavada’ na Marquês de Sapucaí

Por Claudia Mastrange

Após dois dias de desfile repletos de cores, criatividade e emoção, a Unidos do Viradouro (foto acima) conquistou o título de campeã do Carnaval 2020 do desfile do Grupo Especial do Rio de Janeiro. Após 23 anos sem ganhar um titulo, a escola de Niterói levou para a avenida o enredo ‘Alma Lavada’, dos carnavalescos Marcus Ferreira e Tarcisio Zanon, contando a história das ‘Ganhadeiras de Itapuã’, grupo de mulheres escravizadas ou libertas que lavavam roupa na Lagoa de Abaeté e prestavam outros serviços, com o objetivo de comprar suas alforrias. União da Ilha e Estácio de Sã foram rebaixadas.

O ‘Jesus da gente’ da Mangueira (Diário do Rio)

As seis primeiras colocadas, além da Viradouro, Grande Rio, Mocidade Independente de Padre Miguel, Salgueiro, Beija-Flor e Mangueira, voltaram para o desfile das campeãs, que aconteceu debaixo de um temporal que atingiu o Rio no dia 29 de fevereiro. Sem o peso da disputa, os componentes desfilaram com alegria e descontração, apesar da chuva torrencial, que desmanchou fantasias e acabou fazendo a cantora Elza Soares, de 89 anos, homenageada pela Mocidade, desistir desse segundo desfie, por recomendação médica, e foi representada pela neta Vanessa.

A Imperatriz Leopoldinense, por sua vez, estará de volta ao Grupo Especial em 2021, já que sagrou-se campeã do Grupo A. A agremiação reeditou o enredo que deu o bicampeonato à escola em 1981, ‘Só dá Lalá’, uma exaltação ao compositor Lamartine Babo. Rainha de bateria da agremiação, a cantora IZA foi pé quente ao estrear no posto.

A nota triste no desfile da Série A foi a apresentação da Império Serrano. A ala das baianas entrou sem saia na Marquês de Sapucaí e muitas caíram no choro. O problema teria sido na costura das saias, que não encaixavam, mas houve vários outros, como carros atrasados, durante o desfile. Nove vezes campeã do Grupo Especial, a Serrinha ficou com o nono lugar na Séria A.

Confira como foram os desfiles do Grupo Especial!

Estácio e Sá
A Estácio de Sá, de volta ao grupo especial após quatro anos e capitaneada pela respeitadíssima carnavalesca Rosa Magalhães, detentora de nove títulos, entrou com garra na avenida. O enredo ‘Pedra’ foi defendido com empolgação e samba no pé e belas alegorias, como Abre-Alas, que mostrava do primitivismo às viagens à lua. A escola, porém, acabou sendo rebaixada.

Viradouro

Anna Giulia: sereia na Viradouro (Fernando Grilli/Riotur)

A Viradouro chegou chegando à avenida. A agremiação de Niterói deu um banho de criatividade e beleza ao levar para o desfile um tanque com sete mil litros de água, em que a atleta da seleção brasileira de nado sincronizado, Anna Giulia, tornou-se uma bela sereia que ficava até um minuto submersa, evoluindo. Tudo a ver com o enredo da escola ‘Viradouro de Alma Lavada’, que homenageou as ‘Ganhadeiras de Itapuã’.

Mangueira

Leci Brandão vibrou com a Mangueira (Diário do Rio)

Honrando a expectativa em torno de seu enredo, a Mangueira, campeã de 2019, emocionou, mostrando Jesus Cristo que pode assumir várias faces. E por que não? Nascer na favela ou vir ao mundo na forma feminina, como representou a rainha de bateria Evelyn Bastos. Ela encarnou ‘Jesus Mulher’, com respeito e graça. No fim, o Cristo crucificado era negro e as marcas de pregos foram substituídas por marcas de tiro. Qualquer semelhança certamente não é mera coincidência.

Grande Rio
O desfile da Grande Rio foi marcado pela força espiritual do enredo, que contou a história do líder espiritual de santo Joãozinho da Goméia, mas também por alguns sustos. Ainda na armação, com os primeiros componentes entrando, o imenso Abre-Alas quebrou o chassi e não conseguia entrar na avenida. Abriu-se um grande espaço, mas logo o problema foi contornado e o carro passou já com pequenas avarias. Perdeu décimos no quesito evolução, mas por pouco não leva o titulo.

São Clemente

Adnet: autor do samba da São Clemente (David Normando/Riotur)

O enredo da São Clemente enfocou ‘O Conto do Vigário’ com o rol de espertezas e ‘jeitinhos’ que há tempos assolam as relações sociais e políticas. Na crítica bem-humorada, destaque para a bateria de ‘laranjas’, a ala da grávida de Taubaté e o humorista Marcelo Adnet, autor do samba-enredo da agremiação, que encarnou o presidente da República, com direito a fazer ‘arminha’ com a mão. “Hoje temos o conto do vigário institucionalizado. Mas o samba propõe uma virada, uma mudança nessa realidade”, declarou o artista.

Vila Isabel

Aline Riscado: rainha da Vila Isabel (David Normando/Riotur)

A Vila contou, em forma e lenda, a história dos 60 anos de Brasília com o enredo ‘Gigante Pela Própria Natureza: Jaçanã e um Índio’. O Abre-Alas monumental, com mais de 70 metros de comprimento, foi um dos destaques. A rainha de bateria, Aline Riscado, estava belíssima, mas a apresentadora Sabrina Sato roubou a cena, desfilando ao lado do cantor e compositor Martinho da Vila, patrimônio vivo da Vila e da cultura nacional.

Salgueiro

A rainha das rainhas Viviane Araujo (Fernando Grilli/Riotur)

A escola levou para a avenida a história de Silas de Oliveira, o primeiro palhaço negro do Brasil, nascido em 1870. Multitalentoso, era também músico, compositor, ator, acrobata… “É um enredo necessário”, declarou a atriz Érika Januzza, musa da escola, que se emocionou com o desfile. A escola exaltou a representatividade, sempre fazendo referência ao circo, e trouxe Aílton Graça encarnando Silas. A rainha das rainhas, Viviane Araújo, brilhou mais uma vez e o carro de som, com os cantores fantasiados de bichinhos, foi um dos mais criativos.

Unidos da Tijuca
A Tijuca levou à Sapucaí o sonho de um Rio perfeito, idealizado pela mente criativa – e campeoníssima – do carnavalesco Paulo Barros, de volta à escola. ‘Onde Nascem os Sonhos’ desenhou um Rio com boas condições de saúde, educação, segurança e urbanização, bem diferente da cidade que nem água potável consegue oferecer aos moradores. A rainha de bateria Lexa caiu durante a evolução, mas, apoiada pelo mestre Casagrande, levantou e seguiu lindamente. “Já caí e levantei muitas vezes na vida. Eu levanto e sigo em frente”, declarou a cantora.

Mocidade Independente de Padre Miguel

‘Elza Deusa Soares’ (Raphael David/Riotur)

Um dos desfiles mais aguardados, por homenagear a diva Elza Soares, de 89 anos, a Mocidade Independente de Padre Miguel contou a trajetória da ‘Elza Deusa Soares’, mostrando desde a menina que cantava levando a lata d´água na cabeça e que, no programa comandado por Ary Barroso, declarou ter vindo do ‘planeta fome’, até a estrela internacional e referência para as mulheres negras, pobres, batalhadoras do pão de cada dia e do respeito que ainda está longe do ideal. Não é a toa que a letra do belo samba de Sandra de Sá exalta: “Essa nega tem poder!”.

Beija-Flor

Selminha e seu inigualável sorriso (David Normando/Riotur)

Determinada a virar o jogo em relação a 2019, quando quase foi rebaixada, a Beija-Flor de Nilópolis causou impacto assim que iniciou o desfile e disputou décimo a décimo o título. No Abre-Alas, uma turma em motocicletas e figurinos ao estilo ‘Mad Max’ introduziu o enredo, de Alexandre Louzada e Cid Carvalho, ‘Se Essa Rua Fosse Minha’, que fala das ruas, estradas e caminhos da vida, desde a criação do mundo. Neguinho da Beija-Flor exaltou a emoção sem igual de estar a avenida. “Eu me casei aqui. Aqui estão os melhores momentos a minha vida. Curei um câncer aqui, cantando. Devo tudo a Deus, às pessoas que sempre torceram e rezaram por mim e esse palco iluminado”, disse.

União da Ilha
A escola apostou na crítica social e, logo na abertura, apresentou um carro representando uma comunidade, com o sobrevoo de um helicóptero, cena comum no cotidiano do Rio de Janeiro. A Ilha, no entanto, teve problema com um dos carros e, no final, precisou correr muito, mas estourou em um minuto o tempo regulamentar para o desfile. Acabou ficando na última colocação, descendo para o Grupo A.

Paraíso do Tuiuiti
O fictício encontro de dois ‘Sebastiões’ – o padroeiro do Rio São Sebastião e o rei português Dom Sebastião – foi o enredo da Paraíso do Tuiuti. A ideia era pedir proteção em dobro para o Rio. Destaque para os bonecos realistas, representando pessoas da comunidade e a estreia da apresentadora Lívia Andrade como rainha de bateria. A escola ficou com a décima primeira colocação, escapando do rebaixamento.

Portela

O azul imenso da Portela (Fernando Grilli/Riotur)

A águia da Portela soltou seu tradicional grito para encerrar o primeiro dia de desfiles com chave de ouro, ou melhor, com um mar azul.

A porta-bandeira Lucinha ‘deu à luz’ um indiozinho em pena avenida e cores da Portela encheram de cor e brilho a Sapucaí, na hora em que o dia começava a clarear. Apesar da beleza, a escola de Madureira ficou com a sétima colocação e não voltou para o desfile das campeãs.

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