Cresce número de pessoas que buscam aprender Libras para auxiliar população surda em atividades do dia a dia, como consultas de saúde e cerimônias religiosas
“Como nutricionista, eu tenho que me comunicar com todos os meus pacientes. A língua de sinais para mim faz com que eles sejam vistos e não negligenciados. Esse é meu principal objetivo”. Esse é o sonho da estudante de nutrição Beatriz Correia Ziomek, de 20 anos, que iniciou a vida acadêmica com uma motivação: promover a humanização e a inclusão em seus futuros atendimentos. Por meio da Língua Brasileira de Sinais (Libras), Beatriz vê na comunicação uma forma de se conectar da melhor forma possível com seus pacientes, uma qualidade que, para ela, todos deveriam usufruir, independente das dificuldades trazidas pelas deficiências.
E os desafios não são poucos. Assim como a linguagem fonética, a língua de sinais também possui variações. “Por mais que seja o segundo idioma reconhecido no Brasil, ele muda bastante por conta das gírias regionais. A mesma palavra pode ser expressa de vários jeitos, então os sinais são diferentes aqui em Curitiba, São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo”, conta Beatriz, que participou de um curso de capacitação em Libras, para alcançar seus objetivos. Datilologia, variações regionais e conversas em grupo foram os principais aprendizados da futura nutricionista nesse início de jornada em busca do sonho.
Levar inclusão a todos os ambientes também é a motivação da estudante de biomedicina Myllena Morelli, de 17 anos, que sonha em fazer a tradução simultânea das cerimônias religiosas que participa. “Eu quero alcançar vidas de todas as formas e, na minha igreja não há alguém que faça a tradução, então eu seria a primeira. Outro motivo é poder me comunicar com um colega surdo da minha turma”, conta Myllena. Ela percebeu que a dificuldade auditiva é uma barreira na socialização com o colega, tanto para ela quanto para os demais estudantes.
“Ele é muito extrovertido e engraçado, vejo que a turma não interage muito com ele, não por não querer, mas por não saber como”, explica. Essas situações não são incomuns: segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população surda no Brasil chega a 5%, o que representa, aproximadamente, 10 milhões de pessoas que possuem a deficiência das mais diversas formas: parcial, total, unilateral (quando ocorre em apenas um dos ouvidos) ou bilateral. Dessas 10 milhões de pessoas, 2,7 milhões não escutam nada. Esse público é ainda mais dependente da língua de sinais para conseguir se comunicar.
Inclusão para todas faixas etárias
Para apoiar essas pessoas que buscam se aprimorar pensando nessa população, há também a demanda por cursos que repliquem esses conhecimentos. No Paraná, o Centro de Integração Empresa-Escola do Paraná (CIEE/PR) oferece capacitações gratuitas que trabalham conceitos teóricos e práticos de iniciação à Língua Brasileira de Sinais para pessoas a partir dos 14 anos, experiência vivida pelas estudantes Beatriz e Myllena. “Pensamos em um conteúdo que abrangesse o vocabulário para auxiliar no cotidiano de cada participante. A resposta da turma foi tão boa que conseguimos prolongar o conteúdo e já tivemos pedidos para continuidade do curso”, conta a instrutora de Libras do CIEE/PR, Talita Gabrielle Ferreira Barroso Toleto. Um dos diferenciais do curso é o foco na prática, com conteúdos a serem aplicados imediatamente na comunicação, como expressões de “bom dia”, “olá”, cores e até pedidos de socorro, distribuídos em seis tardes.
O perfil da turma é amplo: jovens e adultos motivados que perguntam, interagem e até pedem novos conteúdos à instrutora. “Tenho alunos de ensino médio e outros mais velhos que já estão inseridos no mercado de trabalho, desde pessoas que atuam em hospitais até colaboradores do próprio CIEE/PR. A maioria está procurando capacitação pensando no mundo de trabalho, mas também há quem queira se comunicar com amigos e conhecidos que são surdos. É muito legal que o que aprendem aqui está sendo levado para dentro de suas próprias casas, ensinando os familiares também”, comemora a instrutora.
Capacitação da equipe
E trazendo o exemplo para casa, os cursos de capacitação também estão transformando a carreira de colaboradores do próprio CIEE/PR. As recepcionistas Cláudia Verônica da Silva e Camila Gabrielle Lemos Pereira, de 53 e 23 anos, se inscreveram na capacitação e já estão aplicando os conceitos no atendimento presencial da instituição, que recebe frequentemente pessoas com necessidades especiais. “É essencial que todos saibam minimamente se comunicar com pessoas surdas. Na minha área de atuação, é indispensável que eu possa dar um bom dia e perguntar o nome, por exemplo. São comunicações tão simples que transformam os momentos de troca e acolhem esse público”, reforça Cláudia. Para a recepcionista, a oportunidade elevou sua capacidade de trabalho e proporcionou muito mais oportunidades do que poderia imaginar.
“Temos tanto o curso de Libras quanto de outras áreas com tradução simultânea. Nosso sonho é disponibilizar essa linguagem em todos os cursos de capacitação que oferecemos, e estamos aplicando cada vez mais, já que o público surdo tem nos buscado por essas oportunidades que possuem qualidade, certificação e são gratuitas”, reforça a coordenadora do Núcleo de Capacitação e Cidadania do CIEE/PR, Carla Andreia Torres Galvão.
Junto do caráter profissional, o curso também traz satisfação pessoal e alegria aos participantes, motivados durante toda a aula a aprender e colocar em prática os conteúdos. Para Gabrielle, a oportunidade foi muito além do aprimoramento da carreira, já que promoveu interação constante e muitas atividades práticas coletivas. “Estou muito feliz com essa oportunidade, porque o curso realmente me ajudou. Já havia estudado Libras por vídeos e outros materiais, mas a chance de me conectar com outras pessoas e de fato praticar realmente me surpreendeu. Espero continuar esse aprendizado e evoluir cada dia mais”.
Como participar
Os cursos de capacitação do CIEE/PR são gratuitos, com certificado, e abrangem diversas áreas, como comunicação, marketing, logística e informática. Podem participar pessoas a partir dos 14 anos, por meio de cadastro no site da instituição (www.cieepr.org.br) e acesso na aba “Cursos Gratuitos/Programas Sociais”. A disponibilidade dos cursos pode variar mensalmente. Para mais informações, a instituição atende pelos telefones (41) 3313-4300, para Curitiba e região metropolitana, e 0800 300 4300, para as demais localidades.