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Ars Gratia Artis: Pequeníssimo tratado acerca do ‘timing’: uma perspectiva enxadrística

Texto da coletânea ‘Aventuras Uranianas’

O pai, entre esperançoso e alegre, diz ao filho que está com muita vontade de jogar.

– Estou fazendo o download de um joguinho muito legal… É só esperar um pouquinho… 

O filho, resoluto, sem olhar para o pai, deixa claro o total desinteresse.

– Não quero jogar, papai.  

Tipo de coisa que o pai não deveria fazer. A esperança ingênua se intensifica um pouco mais, abrindo alas para o gran finale… O filho prepara a pregadura. (*1)

 – Mas o jogo é muito maneiro. Você vai adorar!

Agora, ele parece se virar e quase lhe dirige o olhar. O tom da voz, porém, continua longe.  Responde apenas por educação.  Por isso mesmo, prepara o desfecho.  Xeque.

– Eu não preciso desse jogo.

– Eu estou carregando e quando estiver pronto eu lhe avisarei – diz com um tom um pouco áspero (;), tentativa de fazer prevalecer a autoridade paterna.  Inútil. Tudo inútil. Ele esfrega as mãos e uma gota de suor em sua testa [(ou algo do gênero)] o desmascara.  Rei em apuros.

 Embora não sorrisse, o filho tem aquela expressão de conquista estampada no rosto.  Aquela tranquilidade de quem sabe que já ganhou.  Então, joga.  Quase displicentemente.  Desfere:

– Então está bom; você me avisa papai… 

O caminho parecia livre para o incauto pai.  Foi então que, após alguns três segundos – tempo para dar ao adversário a doce ilusão da vitória e, assim, silenciá-lo, avançou com a rainha.

-… Você me avisa quando já tiver desligado o computador…

Xeque-mate.

(*1) – Pregadura ou cravadura (também conhecida coloquialmente como prego ou cravada), no enxadrismo, é uma expressão que indica uma dada posição no tabuleiro na qual uma peça não pode ser movida, uma vez que expõe outra de maior valor à captura ou o Rei ao xeque descoberto.

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