Da Redação
A Lava Jato agoniza e os sinais que apontam para o seu desfecho estão por toda parte. O mais evidente deles veio com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2 de outubro, de anular sentenças e exigir que réus delatores se pronunciem nas alegações finais dos processos antes que os réus delatados. O entendimento do STF poderá provocar a revisão de inúmeras sentenças, em especial a que condenou Lula a 12 anos de cadeia no caso do Sítio de Atibaia.
Mas a postura dos ministros do Supremo não foi o único golpe desferido contra a operação. Ela já vinha sendo alvejada e, por consequência, desmoronando aos poucos nos últimos meses. A aprovação no Congresso da Lei de Abuso de Autoridade, apesar de amenizada pelo presidente Jair Bolsonaro com alguns vetos, contribuiu para reprimir ações de magistrados contra a corrupção. O vazamento de conversas roubadas criminosamente de procuradores, por mais que não tenham comprovado irregularidades, também concorreu para enfraquecer a operação. Até a insana ameaça do ex-procurador-geral Rodrigo Janot de matar o ministro Gilmar Mendes e depois se suicidar, pesou no desgaste.
Se ainda não constitui a pá de cal sobre a Lava Jato, a decisão do STF produz efeitos substanciais na rota da operação, que pode liquidá-la, pois inúmeras sentenças correm o risco de serem anuladas. A primeira sentença de Moro anulada pelo STF foi a do ex-presidente da Petrobras, Aldemir Bendine, condenado a 11 anos de prisão por corrupção. A 2ª Turma não só anulou a sentença de Moro como também mandou que a ação voltasse à fase de alegações finais na primeira instância. O caso Bandine foi usado para beneficiar outro réu da operação: o ex-gerente da Petrobras Marcio de Almeida Ferreira, também condenado por corrupção e lavagem de dinheiro a 10 anos de prisão. Agora beneficiado pelo STF, sua sentença foi anulada e o caso voltará para a primeira instância. Mais um golpe dolorido na Lava Jato.
O presidente do tribunal, ministro Dias Toffoli, completou a votação, no dia 2 de outubro, proferindo um voto pela correção de rumos na Lava Jato. Ficou faltando a modulação de como serão feitas as revisões nos processos. Toffoli quer seguir a proposta do ministro Alexandre de Moraes, segundo a qual só teriam direito à revisão da sentença os réus delatados que pediram para se pronunciar depois dos delatores ainda na primeira instância e que, na ocasião, não haviam sido atendidos pelo juiz Moro. Como a maioria dos ministros não queria uma definição do processo na reunião marcada para o dia seguinte, Toffoli foi pressionado a cancelar a sessão. Não há uma nova data para a decisão final.
Golpes também do Governo
A Lava Jato já havia sofrido escoriações graves com a aprovação da Lei de Abuso de Autoridade pelo Congresso. A nova lei embute uma série de artigos capazes de inibir a ação de magistrados no combate à criminalidade. O presidente Bolsonaro, pressionado por Sergio Moro, vetou pontos dramáticos que atingiam juízes, procuradores e policiais, mas os parlamentares fizeram questão de derrubar vetos importantes. Um deles é potencialmente mortal para a Lava Jato. Por exemplo, juiz que decretar prisão preventiva de bandidos de forma equivocada, poderá ser punido. Moro classificou a manutenção do artigo como “preocupante”, pois juízes já se recusavam a decretar prisões para não correrem o risco de punições.
Apesar dos vetos, as digitais de Bolsonaro podem ser facilmente encontradas no processo de enfraquecimento da Lava Jato. Para proteger o filho Flávio, limitou os poderes da Receita, Polícia Federal e Coaf, braços fundamentais da operação.
Os maiores golpes contra a Lava Jato
— O STF decidiu que todos os réus delatados fazem as alegações finais nos processos depois dos delatores.
— Foram anuladas duas sentenças proferidas pelo ex-juiz Sergio Moro por não seguirem esse posicionamento: do ex-presidente e do ex-gerente da Petrobras. Elas retornaram para a primeira instância.
— Todos os processos em que os réus delatados falaram no mesmo instante dos delatores poderão ser revistos, inclusive a ação em que Lula foi condenado por causa do Sítio de Atibaia.
— A Lei de Abuso de Autoridade inibe que juízes decretem prisões preventivas temendo punições caso o investigado receba depois o habeas corpus.
— Articulada no Congresso Nacional, a lei recebeu vetos do presidente Jair Bolsonaro, mas parte deles foram derrubados pelos parlamentares, vários inclusive investigados por corrupção.
— Para proteger o seu filho Flávio, Jair Bolsonaro interferiu na Receita, na Polícia Federal e no ex-Coaf, agora Unidade de Inteligência Financeira do Banco Central (UIF), afastando pessoas ligadas ao ministro Sergio Moro.
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