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Deleite Linguístico: Mal: um camelão linguístico

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Mal: um camelão linguístico

Tenho por hábito, em minhas turmas de sexto ano, fazer ditados de orações, com o intuito de fomentar a atenção dos estudantes para a modalidade escrita. Digo a eles que estamos simulando um possível texto que terão de transcrever da modalidade falada para a escrita, o que exige conhecimentos prévios de que nem tudo dito é, de fato, para ser escrito sem as devidas alterações que a escrita nos impõe.

Confesso que é um momento em que a turma fica eufórica e que se torna difícil falar. Para poupar minhas cordas vocais, faço do celular um aliado, gravando minhas orações pelo Whatsapp e reproduzindo-as por mais de três vezes, a fim de que a garotada possa escrever, com perfeição e domínio da norma-padrão, o que ouve. 

Desses casos, os que mais me chamam atenção são as possibilidades de escrever o verbete “mal”. Vocês acreditam caros leitores, que há alguns alunos que creem haver apenas duas explicações para o emprego de “mal” e “mau”? O primeiro quando for advérbio de modo; o segundo, adjetivo. É, nesse ínterim, em que eu começo a brincadeira e explico todas as possibilidades que “mal” apresenta, deixando a turminha em polvorosa! Eu simplesmente adoro, e eles também! 

Vamos às explicações: “mal” com L pode ser dependendo do contexto, um advérbio de modo, quando for substituído por “bem”.  Não é assim que assimilamos nas nossas saudosas aulas de português? Pois é aí que ‘mora’ o entrave: acreditar que é essa a única explicação, ignorando as outras possíveis causas para o emprego do L em “mal”. Vamos a elas: usar “mal” também é necessário quando se deseja passar a ideia de tempo. Observem: “Mal cheguei ao trabalho, a chuva caiu”. Dúvidas inexistem de que esse ‘mal’ é sinônimo de “Assim que”, locução conjuntiva que apresenta valor semântico de tempo. Mas não para por aí. A outra oração é “O mal de certas pessoas é não entenderem que nem sempre o mal vencerá.” Deixando de lado a parte filosófica do período, observamos que o “mal”, nos dois casos, é um substantivo, que pode inclusive ir para o plural, gerando “ os males”. Não é fabuloso? Podemos afirmar que “mal” é uma palavra camaleão, pois. 

O mais divertido é apresentar tudo isso à garotada de que gosto tanto e saber que estou fomentando, em cada um (a), o gosto pela língua portuguesa e demonstrando a capacidade enorme que ela tem de nos possibilitar inúmeras versões com o mesmo termo, que muda suas características, a depender do contexto linguístico em que a palavra for empregada! Creio que esta crônica linguística possa mitigar o pensamento de meu amado amigo e arquiteto Cesar Vieira, ao declarar que “Na obra, a língua portuguesa é muito mal falada”! Espero que ele passe a declarar que seus funcionários a escrevem muito bem! Viva a língua portuguesa!

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