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E Nelson Rodrigues chegou à terra de Shakespeare…

Sacha Rodrigues ao lado da estátua do avô Nelson, em Copacabana (Foto: Arquivo pessoal)

Por Sandro Barros

Sacha Rodrigues é produtor, ator e fotógrafo. Também é neto do dramaturgo Nelson Rodrigues, falecido em 1980. Em 2019, Sacha, com ajuda de muita boa, conseguiu no ano passado um feito histórico para o nosso teatro: colocar pela primeira vez a obra de seu avô na Inglaterra, país natal de William Shakespeare, considerado o mais influente dramaturgo do mundo de todos os tempos.

Em um bate papo descontraído num barzinho em frente à Praça Inhangá, em Copacabana, lugar que abriga a estátua de Nelson feita pelo artista Edgar Duvivier, Sacha nos contou como foi essa saga, que culminou com o ‘Nelson Rodrigues Festival London 2019’. E quanto a Shakespeare e suas peças, ele não titubeia: “vovô é o melhor dramaturgo do mundo de todos os tempos!”.

A obra de Nelson já havia sido publicada em outros países?
Sim. Vários textos foram traduzidos para alguns países, como EUA, França, Polônia, Argentina, Japão. Além disso, há versão em hebraico. Isso é muito importante, pois vovô tinha o desejo de ser conhecido além das nossas fronteiras.

E como surgiu a ideia de levar Nelson para a Inglaterra?
Em 2015, a minha esposa Marta Fernandes, diretora e professora de Relações Internacionais na PUC do Rio de Janeiro, ia a um congresso em Londres, onde ficaria uma semana. Daí ela me perguntou se eu conhecia a cidade e eu disse que não. Ela então me animou a ir e eu dei o meu jeito com dinheiro das despesas. Uma semana antes de viajar, olhei a biblioteca lá de casa e vi os dois volumes, contendo 12 das 17 peças de Nelson que o meu pai [Joffre Rodrigues, cineasta], junto com Toby Coe e minha prima Flavia Carvalho, haviam convertido para o inglês americano. Decidi levá-los, inspirado pelo trabalho do meu pai, e comecei então a dar os primeiros passos nesse trabalho.

Chegando a Londres, o que aconteceu?
Antes de viajar, fiz contato com o Itamaraty [Ministério das Relações Exteriores do Brasil] e consegui o contato do adido cultural HayleGabelha. Já em Londres, falei com ele um dia após desembarcar e lhe expliquei a minha ideia. Para minha surpresa, Hayle conseguiu um encontro meu com a Oberon Books, a maior editora de teatro do Reino Unido, para a tarde daquele mesmo dia. Fui acompanhado de NadiaKerecuk, tradutora oficial da Embaixada. Foi feito então o primeiro encontro com George Spender, editor da Oberon Books. Apresentei-lhe os livros do meu pai e um link da edição do New York Times com duas páginas dedicadas ao Nelson. Ele achou muito interessante a minha ideia e me pediu para lhe enviar algumas peças em inglês. Na mesma hora eu lhe passei um pendrive contendo as 12 peças. Isso foi em 22 de abril de 2015…

E em seguida?
Dois dias depois, me encontrei com um velho amigo meu, o ator Pedro Cazarini, quando ele decidiu me apresentar a Ramiro Silveira, professor do curso de Bacharelado de Atuação Internacional da Universidade de Essex, e que é muito fã de Nelson Rodrigues. Ramiro então me fez um convite inesperado em nome da Essex: voltar a Londres em junho para assistir a peça de fim de ano dos seus alunos, que seria ‘Vestido de Noiva’ em inglês, baseado na versão de meu pai. Consegui o dinheiro para a passagem e retornei para assistir a encenação. Foi emocionante! A partir daí Ramiro participou direto, indo às reuniões junto ao Itamaraty para tratar do projeto.

Divulgação

E o tempo não para…
É verdade! Em 2016 voltei para apresentar o filme ‘Vestido de Noiva’ no cineclube da Embaixada. Em 2017, eu e Ramiro montamos uma leitura dramática de “Perdoa-me por me Traíres’ em inglês, baseada na versão do meu pai. Aí eu brinco que em 2018 foi folga, mas em 2019 lançamos a coletânea ‘Nelson Rodrigues: Selected Plays’, com sete peças em inglês britânico e por uma editora britânica.

E o festival Nelson Rodrigues?
Em 2017, tive o primeiro contato com Gustavo Nunes, que em minha opinião é o maior produtor de teatro no Brasil. Estávamos em Londres e ele propôs fazermos o festival, uma ideia que já sido lançada pelo Ramiro Silveira. Começamos então a criar juntos. E porque o festival? Basicamente pelo fato que a noite de autógrafos do livro sem o ator, obviamente, ficaria restrita ao lançamento e coquetel. Quisemos fazer então um festival para celebrar a primeira publicação de Nelson na terra de Shakespeare. Então fizemos o ‘Nelson Rodrigues Festival London 2019’, em 13 e 14 de junho, com presença de 200 pessoas por dia, superando as nossas expectativas. Tivemos o lançamento de ‘Nelson Rodrigues: Selected Plays, leitura dramática de ‘Vestido de Noiva’ em inglês, apresentações de trechos de peças, palestras acadêmicas, além de exposições de objetos pessoais de vovô e versões digitalizadas das telas de Cândido Portinari retratando a família dos Rodrigues, da qual era muito amigo, quando Nelson tinha apenas 16 anos. Todo o festival foi produzido pelo Gustavo. O resultado dos esforços foi termos ganho o prêmio da Focus Brasil de melhor evento cultural brasileiro de 2019 em Londres. Voltei lá e recebi esse importante troféu no dia 16 de novembro do ano passado!

E mais amigos e colaboradores foram chegando, certo?
Certíssimo! E são muitos. O Professor Serpa, da Fundação Cesgranrio, que já havia financiado a estátua de Nelson, também financiou as traduções do livro feitas pela King’sCollegeof London para serem registradas junto à Biblioteca Nacional. A Cesgranrio também deu apoio acadêmico. Temos ainda o Projeto Portinari e o Instituto de Relações Internacionais de PUC do Rio. Luiz Artur Nunes, diretor de teatro e acadêmico, escreveu o prefácio do livro. Não posso deixar de citar Paula Rassi, Fred Arruda, Robert Doring, Márcio Artiaga de Castro e Nina Tereza Mendes, que impulsionou o festival em Dublin, na Irlanda, entre outros. Todos foram e são fundamentais para o sucesso do projeto. Sou muito grato a eles!

Mas algum agradecimento especial?
Tenho sim e ele é para minha esposa. Sem ela o projeto não teria começado.

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