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Elza Soares ‘eu não vou sucumbir’

Por Alessandro Monteiro

Mundialmente conhecida, Elza Gomes da Conceição, prestes a completar 90 anos é reconhecida como a cantora brasileira do milênio, com mais de 30 discos gravados. Em 2019, Elza lançou ‘Planeta Fome’, cantando seu amor pelo país, denunciando também as mazelas dos tempos atuais e gritando ao mundo “eu não vou sucumbir”.

No país, mais de 500 mulheres são agredidas por hora no país, o feminicídio cresce de forma assustadora. Porém, até o momento, nenhuma cantora brasileira se posicionou tanto em relação à causa quanto Elza Soares, que através dos seus últimos trabalhos – ‘A Mulher do Fim do Mundo’ (2015) e ‘Deus é Mulher’ (2018) – deu voz a milhares de mulheres em suas canções. Hoje, sendo inspiração para muitas delas, pois através das canções é reconhecida também como porta voz da luta pelo direito das mulheres e da população negra no país.

No carnaval deste ano, Elza foi enredo da Mocidade Independente de Padre Miguel, escola que cantou os sucessos e dificuldades desta brilhante mulher que nasceu no subúrbio carioca, foi forçada a casar aos 12 anos e, aos 13, já era mãe e teve uma conturbada relação de 15 com jogador Garrincha.

Vítima de violência doméstica e alvo perseguição militar na era da ditadura, Elza, além de grande exemplo na luta pelos direitos da mulher, também utiliza a canção como ato político e, sem dúvida, é a maior cantora do milênio.

A senhora concorda com a frase “é preciso ter coragem, para ser mulher nesse mundo”?
A ‘Senhora’ está no céu. Pode ser você mesmo. Ano passado eu lancei ‘Planeta Fome’, o tema está associado ao que eu acredito; Você sabia que este meu disco fui eu que pesquisei as músicas, sugeri repertório e ainda meti o dedo na produção do Rafa? [Rafael Ramos, produtor do disco]. Minha cabeça é muito louca, cara! Quando Kastrup [produtor do disco] me trouxe essa música do Douglas Germano, não pensei duas vezes, gravei na hora! Até hoje canto ‘Maria da Vila Matilde’ nos meus shows, virou um hino! Essa música é uma forma de alertar e conscientizar a mulher que ela tem que denunciar, muitas não denunciam porque moram e dormem com o inimigo e não tem para onde ir.

Quem é a maior influência na sua vida?
Meu pai! Sempre foi meu pai, Seu Avelino Gomes, um grande homem! Tenho uma ligação forte com ele até hoje.

Precisou vencer algum desafio específico na carreira por ser mulher?
Muitos desafios. Mulher, negra, pobre e artista, tive que provar desde o primeiro momento que eu era capaz. Sempre fui brigona, sempre lutei pelos meus negros, sabia que meu nome na gravadora era Navio Negreiro? Porque todos os compositores negros sabiam que eu gravava as músicas de todos eles. Deixa eu te contar: já caminhamos bastante, tivemos vitórias, mas tem muito que lutar; Todo dia temos que levantar e lutar, não olhar para trás, sempre seguindo em frente. Meu sonho é fazer uma grande revolução feminina, todas juntas, unidas, a mulher tem a obrigação de ajudar a outra. Temos que acabar com esse negócio de que mulher não é amiga de mulher. Temos que nos unir, a mulher tem que ser amiga da outra.

E no desfile? Bateu aquela vontade de se jogar nos braços do povo?
Foi bonito, foi emocionante… Eu olho tudo isso acontecer e lembro que meu pai dizia que eu ia vencer com a minha voz. Tem horas que nem sei como eu cheguei até aqui…

A sua política é a música?
A minha política é estar viva, respirando e não ter medo, lógico! O homem subestima demais a mulher, ele não se lembra que para ele estar aqui tinha que ter uma mulher para dar vida a ele. Por isso afirmo sempre que Deus é mulher!

Uma mensagem para as mulheres?
Mulheres, vamos nos unir cada vez mais, uma dando a mão para a outra.

‘Lá vai menina
Lata d’água na cabeça
Vencer a dor,
que esse mundo é todo seu
Onde a água santa foi saliva
Pra curar toda ferida
Que a história escreveu’
Trecho do samba enredo ‘Elza Deusa Soares’, do carnaval 2020 da Mocidade Independente de Padre Miguel

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